A Lei n.º 37/2003, de 22 de Agosto, que estabelece as bases do financiamento do Ensino Superior Público, da autoria do anterior Governo PSD/CDS-PP, na sequência do rumo que já vinha sendo prosseguido por anteriores Governos, agravou os encargos das famílias e dos estudantes no financiamento do Ensino Superior Público, com um aumento de propinas que disparou de cerca de 200 euros para mais de 840 euros anuais.
Reforço de dotação para o funcionamento dos estabelecimentos do ensino superior
Para pesquisar a situação:
clique aquiA Lei n.º 37/2003, de 22 de Agosto, que estabelece as bases do financiamento do Ensino Superior Público, da autoria do anterior Governo PSD/CDS-PP, na sequência do rumo que já vinha sendo prosseguido por anteriores Governos, agravou os encargos das famílias e dos estudantes no financiamento do Ensino Superior Público, com um aumento de propinas que disparou de cerca de 200 euros para mais de 840 euros anuais. Esta lei correspondeu a mais um passo na desresponsabilização do Estado perante a obrigação que decorre do artigo 74.º da Constituição, de "estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino". Era suposto que todo o volume financeiro gerado pelo contributo dos estudantes, ou seja, pelas propinas, servisse exclusivamente para a promoção da qualidade do Ensino ministrado, mas na realidade não é isso que acontece. O sub financiamento a que os Governos têm condenado as instituições tem contribuído para a deterioração da qualidade e dos meios materiais e humanos disponíveis para a actividade universitária e politécnica.
O actual Governo do Partido Socialista, não só optou pela manutenção da actual Lei de Bases do Financiamento, como lhe introduziu alterações decorrentes da chamada adaptação ao Processo de Bolonha, permitindo assim a cobrança de propinas de montante desproporcionado num vasto conjunto de cursos superiores de 2º ciclo, o que significa objectivamente que o Estado deixou de financiar a formação dos 4.º e 5.º anos de cada curso, passando essa responsabilidade directamente para os estudantes e famílias. Apesar disso, as instituições de ensino superior encontram-se em situação de insolvência ou ruptura financeira, sendo mesmo impossível para algumas garantir o pagamento dos salários até ao final do ano, sem que exista para tal um reforço financeiro. Porém, ao invés de cumprir com a sua obrigação, o Governo obriga estas instituições a aceitar os autênticos processos de chantagem que são os contratos de saneamento financeiro e que se traduzem em mecanismos inaceitáveis de tutela e de controlo governamental das instituições, a pretexto de uma asfixia financeira pela qual é o Governo o único responsável.
Perante a actual situação, o Grupo Parlamentar do PCP entende que tem de ser reposta, no mínimo, a capacidade das Instituições de Ensino Superior para suportar as suas despesas de funcionamento e que tem de terminar a imposição de contratos de saneamento financeiro que limitem drasticamente a sua autonomia. Apesar de o PCP preconizar uma política de financiamento do Ensino Superior completamente distinta da actual, considera urgente criar as condições para que as instituições de ensino superior público possam chegar ao final do ano em curso sem atingir uma situação de ruptura absoluta.
Assim, o presente Projecto de Resolução visa o reforço de dotação para o funcionamento dos estabelecimentos do ensino superior e tem por base uma ponderação cuidada da actual situação do ensino superior que se traduz no seguinte:
1- Despesas de pessoal e de funcionamento de 2008
A distribuição orçamental do Orçamento do Estado para funcionamento, sendo de natureza "distributiva", como lhe chama o Ministério da Ciência Tecnologia e Ensino Superior, não atende aos factores de agravamento dos encargos das instituições. Usa até factores como a actualização salarial, promoções, subsídio de refeição, outras despesas de pessoal e até um subsídio de insularidade para as instituições das Regiões Autónomas, como se fosse usá-los para definir incrementos aos orçamentos para garantir equilíbrio financeiro. De facto, estes factores são considerados apenas para situar as instituições relativamente umas às outras na distribuição de um montante total, fixo à partida, e que o Ministério tem vindo a fazer diminuir artificial e arbitrariamente ao longo dos últimos anos.
A tabela seguinte representa o financiamento médio por aluno (valores nominais em euros, não corrigidos por qualquer índice) ao longo dos três últimos anos.
2006
2007
2008
Subsistema universitário
4.461
4.154
4.168
Subsistema politécnico
3.344
3.157
3.098
Total
4.077
3.791
3.772
O valor de 2003 era, aproximadamente, de 4.449 euros. Mesmo apenas em termos nominais, a redução foi de 15,2% entre 2003 e 2008. Note-se que na União Europeia há uma meta definida de financiamento do ensino superior de 1,2% do PIB. No nosso país diminuiu de cerca de 1% em 2005 para cerca de 0,7% em 2008, o que torna indispensável a curto/médio prazo:
a) Repor a capacidade de remuneração do pessoal das instituições a partir das dotações de Orçamento do Estado, o que implica um reforço orçamental mínimo, variável de instituição para instituição, que corresponde à diferença entre as despesas estimadas com pessoal em 2008, que o Ministério conhece detalhadamente, e as dotações de Orçamento do Estado atribuídas às instituições. Apenas no caso da Universidade dos Açores poderá não haver necessidade de reforço segundo este critério.
b) Dotar as instituições de um montante adicional para fazer face aos descontos para a CGA, como aconteceu no caso das autarquias. Esta medida é complementar da anterior, na medida em que os descontos para a CGA são de facto encargos com pessoal.
Note-se que várias instituições estão, de qualquer modo, confrontadas com a impossibilidade de fazer face a este encargo em 2008, nem sequer lhes valendo, na maior parte dos casos, o recurso a saldos, já que algumas os esgotaram entretanto.
Importa salientar que a obsessão do défice, traduzida na regra do equilíbrio orçamental, teve em 2007, no caso das instituições do ensino superior, uma concretização: um corte no Orçamento do Estado de 6,4% a somar ao desconto de 7,5% dos salários para a Caixa Geral de Aposentações sem contrapartida, a somar ainda à actualização salarial, aos encargos com as progressões inevitáveis dos trabalhadores nas carreiras docente e não docentes e à inflação, correspondendo a uma contracção de cerca de 20% na capacidade aquisitiva.
Em 2008 o desconto para a CGA é de 11%, agravando em cerca de 3,5% o verificado no ano anterior, de novo sem contrapartida.
Esta situação traduz-se no aniquilamento, na prática, da autonomia universitária consagrada constitucionalmente, e passa-se já actualmente com quatro universidades, obrigadas a ter um controlador financeiro e as contas examinadas ao detalhe pela estrutura do Ministério. Primeiro esgotaram-lhes os recursos e depois acusaram-nas de não serem capazes de se gerir.
2- Os saldos e a capacidade para captar financiamentos com subsidiariedade
Há dois tipos de situações problemáticas que se distinguem pela natureza do prazo a que dizem respeito. Um que diz respeito à necessidade de cabimentação de despesas previstas em projectos com financiamento parcial, e outro que diz respeito à gestão do dia-a-dia das disponibilidades no curto prazo.
As instituições que ainda o conseguem fazer usam disponibilidades transitadas para cabimentar despesas com iniciativas para as quais logram obter financiamento que exige contrapartida por receita própria.
Esta possibilidade, (drasticamente agravada por via dos descontos para a CGA), vai desaparecer por asfixia financeira completamente dentro de pouco tempo. Algumas instituições já não a têm e, em 2009, todas virão a ficar sem ela. Esta situação limita drasticamente a capacidade das instituições para tirarem partido de sistemas de incentivos que são hoje praticamente a única via para concretizarem projectos. Cortar esta possibilidade corresponde a condenar as instituições ao definhamento a curto prazo, já que praticamente só lhes restam modalidades de financiamento competitivo, associadas à necessidade de comparticipação com verbas próprias - esta característica, antes associada sobretudo aos projectos europeus, é hoje predominante em todas as oportunidades de captação de financiamento.
A imposição da regra do reequilíbrio financeiro impossibilita a intervenção das instituições. Por isso mesmo torna-se imperioso que, conjugadamente com a contrapartida para a CGA, se garanta às instituições capacidade para usar as disponibilidades não consignadas para os casos em que elas sejam mobilizadas para iniciativas que requeiram comparticipação financeira própria, seja esta para projectos directamente financiados pela União Europeia ou não.
Assim, para fazer a gestão de tesouraria que viabilize a captação de financiamentos por reembolso é necessário que a regra de reequilíbrio orçamental não seja aplicada nestes casos concretos.
Tendo em consideração o acima exposto, e ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República e da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República recomende ao Governo, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, a implementação das seguintes medidas:
1- Promover o reforço imediato da dotação para funcionamento das instituições e estabelecimentos de ensino superior, repondo nos orçamentos das instituições as verbas necessárias à garantia da sua qualidade, eficácia, eficiência e relevância social, bem como dos direitos do pessoal docente, investigadores e pessoal não docente e os respectivos descontos para a Caixa Geral de Aposentações;
2- Eliminar o "congelamento" dos saldos transitados, começando por aceitar o princípio de que o limite de saldo transitado a não ultrapassar seja igual ao que se verificou quando essa medida foi tomada, descontadas as reduções já autorizadas para pagamento das contribuições extraordinárias para a Caixa Geral de Aposentações;
3- A celebração de contratos programa ou contratos de desenvolvimento das instituições de Ensino Superior, de forma a viabilizar-lhes planos estratégicos que se integrem nos processos de desenvolvimento regional e nacional, sem pôr em causa a autonomia universitária, o respeito pelo Estatuto da Carreira Docente Universitária e pelos direitos dos docentes, investigadores e pessoal não docente, designadamente quanto à concessão de licenças sabáticas e dispensas de serviço docente para doutoramento.
Assembleia da República, em 11 de Junho de 2008