terça-feira, agosto 18, 2009

Ruralidade terceirense

A ruralidade terceirense foi alvo de um estudo por parte de professores da Universidade dos Açores. " A Ruralidade em Contexto Insular: a sustentabilidade edificada ao ritmo dos afectos" deu nome à tese de mestrado de Eva Vidal, em Educação Ambiental. O trabalho centrou-se na freguesia do Raminho, uma das mais rurais da ilha, de acordo com os investigadores. Eva Vidal admite que o facto de ser professora no Raminho também pesou na escolha da freguesia, mas foram as características da população local que a chamaram à atenção. O estudo, que contou com a orientação de Félix Rodrigues, do departamento de Ciências Agrárias da Universidade dos Açores e de Cristina Palos, do departamento de Ciências da Educação, foi apresentado no 2º Congresso Lusófono de Ciência Regional, em Cabo Verde, com o nome “Desenvolvimento sustentável no mundo rural insular - Caso de estudo de uma comunidade da ilha Terceira”. O objectivo foi perceber como é que se reconfigurava a ruralidade na actualidade. Eva Vidal confessa, no entanto, que partiu de uma matriz errada quando começou a realizar o estudo. Cedo a investigadora se apercebeu que teria de a adaptar ao contexto rural insular. “A matriz de desenvolvimento que se preconizava para esta comunidade, numa fase inicial, inscrevia-se na linha de alguns modelos de análise utilizados na descrição de interpretação das transformações does espaços rurais”, revela.De acordo com a investigadora, a matriz inicial apelava a uma noção de desenvolvimento, baseada num modelo urbano, que defendia que a transformação dos meios rurais deveria ser feita segundo uma lógica de modernização, recorrendo à industrialização da agricultura e provocando a metamorfose da cultura local, por via da difusão tecnológica e dos valores urbanos. “Colocámos ênfase na dimensão económica do desenvolvimento”, explica.
OUTROS VALORESFoi no contacto com a população da freguesia, que Eva Vidal se apercebeu que para os raminhenses o desenvolvimento económico não se apresentava como uma prioridade. As crenças religiosas, o convívio inter-geracional e a preservação do ambiente são exemplos do que a população valoriza, acima dos bens materiais. Numa primeira análise, os investigadores interpretaram algumas das características do local de forma pejorativa. De acordo com a análise feita, o Raminho apresentava “ausência de emprego local, numa estrutura económica predominantemente baseada na agro-pecuária e na exploração leiteira”. A população apresentava também uma “elevada taxa de analfabetismo” e “baixos níveis de qualificação ou formação”, assim como uma “tendência demográfica recessiva”. Os investigadores registaram ainda uma “alteração da estrutura de emprego sinalizada pela importância que os sectores secundário e terciário assumem em detrimento do sector primário”. Estas características de “desvalorização dos problemas económicos e sociais locais” foram interpretadas como um sinal de “inércia, passividade, alheamento”, associados a “subdesenvolvimento e resistência à mudança”.No entanto, um conjunto de outros factores dava uma leitura contraditória da freguesia. Os habitantes defendiam, por exemplo, a “preservação do património natural, geomorfológico e cultural” e apresentavam “uma manifesta capacidade de mobilização dos movimentos associativos locais de cariz social e cultural”, assim como a “persistência de traços comunitários ancestrais, códigos de conduta e de valores marcados pela entreajuda, a união e a solidariedade inter-geracional”. Perante os dados contraditórios, os investigadores chegaram à conclusão de que era necessário adoptar um modelo que tivesse em consideração as singularidades do meio rural. “A sustentabilidade do espaço rural insular açoriano deve perspectivar-se nas dimensões temporais do presente e do futuro, em que a intervenção esteja conectada com a realidade de cada território. Devem procurar-se políticas de reconversão e não de ajustamento”, defende. Félix Rodrigues resume a constatação a uma frase. “A gente procurava uma lógica de desenvolvimento, mas eles procuravam uma lógica de envolvimento”, salienta. De acordo com o professor, a população não quer que o seu meio seja “artificializado”. O que os raminhenses querem é sentir-se mais “envolvidos” e “comprometidos” com a sua terra. SOLUÇÃOO estudo concluiu que o desenvolvimento da freguesia deve ser feito, tendo em conta a opinião dos seus moradores. “A abordagem tem de ser feita de modo informal, face a face, ombro a ombro com os habitantes, para percepcionar os sentidos e os significados que atribuem ao seu território”, defende a autora. É por isso que os raminhenses dão mais importância ao poder local. Em muitos casos, os populares sentem que existe falta de diálogo com outros decisores políticos, o que não lhes permite participar como desejam na tomada de decisões sobre a sua terra. Eva Vidal salienta também a existência de “líderes” na freguesia, pessoas admiradas e respeitadas por outras, que assumem essa posição de uma forma natural. “As orientações estratégicas comunitárias de desenvolvimento rural, através de alguns programas, introduzem possibilidades de governação inovadoras, baseadas em planos de desenvolvimento local, a partir de abordagens do tipo ‘bottom-up’, no desenvolvimento de parcerias, numa aproximação multi-sectorial, na implementação de cooperação e no desenvolvimento de redes inter-locais”, reforça.Os habitantes do Raminho têm ideias bem definidas sobre o que não querem ver implementado na sua freguesia. Para eles o desenvolvimento local não pode desestruturar as relações interpessoais nem as características típicas do local, como a paisagem e a tranquilidade, o ambiente e a liberdade, a harmonia e qualidade de vida ou a segurança.Félix Rodrigues salienta mesmo que muitos dos habitantes sugerem serem eles próprios a proporcionar visitas guiadas ao Raminho, serem guias turísticos de uma terra que conhecem melhor do que ninguém. Está vincada na população da freguesia a intenção de dar a conhecer a sua terra a quem passa por lá de visita. Fazem questão que os turistas guardem boas recordações do Raminho. “É necessário reforçar legitimidades, valorizar a capacidade interventiva, de mobilização e de decisão da população local, em quem reside a oportunidade de perseguir e acreditar na transformação e revitalização do seu espaço, com a vontade e as iniciativas locais, daqueles actores que melhor conhecem o seu território e o sentem como espaço de afectos. É necessário e inadiável unirem-se esforços, criarem-se compromissos com o poder público e incentivos externos para decidir a realização de projectos sustentáveis e indutores do progresso”, adianta a autora.O estudo centrou-se apenas numa freguesia do concelho de Angra, no entanto, os autores estão convencidos que tirariam conclusões semelhantes em outras freguesias rurais dos Açores, especialmente em ilhas de menor dimensão. A FREGUESIAOutrora Raminho dos Folhadais, a freguesia que serviu de base ao estudo, situa-se na costa noroeste da ilha Terceira, entre os Altares e a Serreta. O nome foi-lhe atribuído por ser uma terra fértil, mas de pequena dimensão, por oposição à fertilidade do Ramo Grande. Apesar dos transportes tornarem, hoje em dia, qualquer freguesia da Terceira próxima do centro urbano, noutros tempos, o Raminho estava isolado de Angra do Heroísmo. Foi esse isolamento que a tornou na freguesia mais rural da ilha. No entanto, o que distingue o Raminho de outras freguesias rurais é o facto de ter conseguido manter os mesmos valores e costumes ao longo dos anos. Eva Vidal salienta que hoje os raminhenses não vivem na terra por falta de opções. Fazem-no por escolha própria. Muitos dos que hoje habitam no Raminho, já passaram por cidades internacionais. A maior parte emigrou para os Estados Unidos da América. No entanto, apesar de lhes ter sido dada a hipótese de viver noutro sítio, voltaram à sua terra natal. Álamo de Oliveira é um desses habitantes. Natural do Raminho, o escritor já viveu fora da freguesia, mas optou por voltar. Vive no Raminho por escolha própria e não por obrigação. É a povo que lá vive que o cativa.“A terra tem sobretudo a sua gente, que é uma gente trabalhadora, afável, não são propriamente exploradores de intrigas, antes pelo contrário e isso quer a gente queira quer não, independentemente dos afectos que vamos criando com as pessoas, acaba por nos atrair”, revela.Álamo de Oliveira confirma que o Raminho soube trazer até aos dias de hoje as tradições de antigamente. “Já houve épocas de entusiasmos maiores, mas de qualquer maneira continuam a manter as suas tradições de forma quase exaustiva, mas ao mesmo tempo introduzindo algumas inovações, que vêm não só fazer com que essa tradição se perpetue e continue, como também vêm a melhorá-las em termos de qualidade”, salienta.“Quando eu falo em tradições estou a falar sobretudo da forma como eles ainda festejam o carnaval, há sempre um ou dois grupos a fazer bailinhos de carnaval, a maneira com ainda festejam as suas festas de verão, a maneira como realizam ainda os seus bodos…”, enumera.O escritor raminhense realça, no entanto, as capacidades intelectuais da população da freguesia. “Há outra particularidade extremamente interessante. É que o Raminho apesar de ser uma freguesia iminentemente rural, é uma freguesia com uma grande apetência cultural e intelectual. É talvez das freguesias da ilha, embora sendo pequena, que maior percentagem tem de gente formada nas áreas mais variadas das ciências e das letras”, reforça.Uma das tradições mais vincadas na sociedade do raminho é a procissão dos abalos. O evento decorre todos os anos a 31 de Maio, desde 1967, de forma a assinalar a crise sísmica decorrida nesse ano.“A procissão dos abalos mantém-se com a mesma força que tinha. Vai gente de todas as idades, crianças, jovens…Continua a ser uma procissão altamente participada. Trata-se de facto de uma promessa feita por pessoas do Raminho, há mais de 100 anos, que quer chova quer faça vento, continua a ser realizada naquele dia”, afirma Álamo de Oliveira.A procissão tem no entanto um cariz diferente das comuns manifestações religiosas da ilha. As diferenças são evidentes desde já no horário A procissão ocorre por volta das 6h00. Mas também vestuário é invulgar. Ao contrário do que é habitual, a população não se veste de forma mais requintada para celebrar o acontecimento. Vestem as roupas de trabalho, até porque mal acaba a procissão retornam às suas casas, ou em muitos casos, hoje em dia, às paragens de transportes públicos. Ninguém sai da Igreja e ninguém volta à Igreja. “Mudaram a hora inicial exactamente para que os jovens que tinham vontade de ir pudessem ir, porque aquela ruralidade que o Raminho já possuiu e já viveu está um pouco mais diluída, evidentemente. Há menos gente a trabalhar no campo, porque há muito mais gente a trabalhar fora. E portanto teve que se olhar aos horários dessas pessoas”, acentua.Esta passagem do testemunho de geração em geração ocorre de uma forma natural. A juventude mantém um diálogo aberto com os mais velhos, sem que seja necessário existir uma imposição. Para Eva Vidal, a Escola Primária do Raminho assume um papel fundamental, na continuidade desses valores.

(in DI-Revista)

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6 Comments:

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