Apresentações e debates sobre a falta de água no Concelho de Angra do Heroísmo
Realizou-se, na passada Sexta-feira, integrada nas Comemorações do Campus de Angra do Heroísmo da Universidade dos Açores da Semana da Ciência e Tecnologia 2008, uma sessão de apresentação de dados e possíveis interpretações para a falta de água verificada neste Verão passado, no Concelho de Angra do Heroísmo, a que se seguiu um debate.
Esta actividade contou com o apoio do Centro de Investigação em Tecnologias Agrárias dos Açores, Centro do Clima, Meteorologia e Alterações Climáticas e Núcleo Regional da Associação Portuguesa de Recursos Hídricos.
A sessão, coordenada pelo Professor João Madruga, contou com a presença do Professor Álamo de Meneses, naquela que é a primeira participação pública do novel Secretário Regional do Ambiente e do Mar.
Estiveram presentes ainda a Presidente da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, Drª Andreia Cardoso, a responsável pelos Serviços Municipalizados da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, Drª Sofia Couto, autarcas, deputados, alunos e público em geral.
O Professor Eduardo Brito de Azevedo, primeiro interveniente, após uma apresentação dos dados da precipitação dos últimos 120 anos, classificou os diferentes anos em secos, normais e húmidos. De acordo com este especialista, 2008, cai na categoria dos anos normais, com valores de precipitação acumuladas muito próximas da média. A temperatura mais elevada, poderia ter contribuído para uma aumento da evapotranspiração, todavia, o cálculo da evapotranspiração real, demonstra que essa perda é pouco significativa. Assim sendo, justificar a falta de água no Concelho de Angra do Heroísmo por este dois factores, revela-se pouco adequado.
O Professor Félix Rodrigues, apresentou de forma pictórica as anomalias da precipitação e da temperatura, relativamente às normais climatológicas, para 2008. Este investigador concorda com a análise anteriormente apresentada, referindo que até Junho de 2008, a sua interpretação coincide, no entanto, há desvios mais acentuados em Junho, Julho e Agosto que levam a colocar a hipótese de influência climática nos caudais das nascentes. No que se refere à temperatura, os valores médios mensais estiveram todo o ano acima das normais climatológicos, e apesar desse aumento das temperaturas mínima, média e máxima, não contribuir grandemente para a evapotranspiração real, contribuíu certamente para uma diminuição da precipitação oculta.
"Os nevoeiros na ilha, tem uma importância não desprezável na recarga dos aquíferos". Estes formam-se normalmente quando a diferença de temperatura do ar e do ponto de orvalho é inferior a 2,8ºC. As temperaturas elevadas nos meses de Abril, Maio, Junho e Julho, no interior da ilha, reduziram a quantidade de precipitação interceptada pela vegetação. Entendeu também que a escassez de água em Angra do Heroísmo, tem uma explicação multifactorial, relacionada com aspectos climáticos que precisam ser investigados, como por exemplo a forma como choveu, se intensamente ou chuva fraca e sua distribuição ao longo do dia, com os consumos, que apesar do consumo doméstico em 2008 ter sido ligeiramente inferior relativamente aos anos anteriores, não se sabe os gastos de água associados às grandes obras da via rápida da ilha, nem se sabe as perdas relacionadas com os sucessivos acidentes de ruptura das grandes condutas de água, que ocorreram também nas obras da via rápida. Uma análise dos sismos de 2008, tanto da sua intensidade como dos seus epicentros, não indiciam possibilidade de fractura do impermen dos aquíferos.
O Professor Francisco Cota Rodrigues, apresentou em resenha o estado actual do conhecimento hidrogeológico da ilha Terceira, nomeadamente os comportamentos da água nos estratos geológicos da ilha, os vários tipos de aquíferos existentes, suspensos e basal, os diferentes tipos de captação realizados ao longo dos séculos, como poços, poços de maré, captação de nascentes e furos de captação tanto de aquíferos suspensos como do aquífero basal.
Este investigador apresentou as áreas mais prováveis para a recarga de nascente na ilha, dando ênfase às nascentes do cabrito e do nasce-água.
Para Cota Rodrigues, a maioria das nascentes da ilha Terceira tem caudais muito baixos, tornando-se difícil a sua captação, sendo muito poucas aquelas que tem caudais elevados e que faz com que seja efectivamente eficaz, em termos económicos a sua captação.
Referiu ainda que a precipitação oculta tem grande importância na recarga de aquíferos, especialmente no Cabrito e Nasce-Água.
Os furos de captação de aquíferos suspensos deverão ser bem estudados, entendendo ser necessário que alguns captem o aquífero basal.
A Doutora Emília Novo, do Laboratório Nacional de Engenharia Civil, levantou um vasto conjunto de questões que teriam que ser estudadas para dar uma resposta cabal a esse problema. Acentuou que os aquíferos pequenos, como o caso do Cabrito, são muito vulneráveis à estiagem, possuindo comportamentos imprevisíveis. Considerou que aí a precipitação oculta poderá desempenhar um papel importante na recarga e a forma como choveu tem efectivamente importância na recarga desse mesmo aquífero.
Os dados da precipitação dos últimos anos não apresentam uma tendência clara de modo a se poderem relacionar com alterações climáticas, mas, apesar disso, devem ser devidamente acompanhados porque podem indiciar tendências futuras.
A evapotranspiração real, de facto não foi incrementada até porque as plantas optimizam a "gestão das águas" abrindo e fechando os estomas para regular a perda de água. Referiu que o estudo desse fenómeno é importante no contexto das alterações climáticas.
De acordo com esta investigadora, se o Cabrito é vulneravel à estiagem, o aquífero basal é vulneravel à salinização. Tanto um tipo de exploração como outro necessita de ser monitorizado.
No que se refere à recarga artificial de aquíferos, defendeu que não se deverá avançar para essa solução porque, tal como referido por Cota Rodrigues, o tempo de permanência da água nesses aquíferos é reduzido, o que corresponde a não armazenamento eficaz. Haverá que conhecer muito bem a estrutura dos aquíferos e o seu volume para que tal solução seja eficaz.
O Engº Dinis Pereira, do Gabinete de Ecologia Vegetal do Departamento de Ciências Agrárias da Universidade dos Açores, apresentou os principais resultados do estudo da distribuição das turfeiras de Sphagnum na ilha Terceira referindo a importância dessas turfeiras na retenção de água na ilha e na regulação de caudais de nascentes. Referiu ainda os impactos que estão associados a arroteias de zonas húmidas na disponibilidade de água na ilha.
Apresentou as principais áreas da ilha sensíveis em termos de arroteias e apresentou estimativas para a avaliação da precipitação oculta nessas zonas.
A Engª Cândida Mendes, explicou a formas como o Sphagnum, acumula água, classificou os vários tipos de turfeiras existentes na ilha e quantificou a quantidade de água que foi perdida numa arroteia realizada nas proximidades das Furnas do Enxofre. Afirmou ser possível a recuperação de zonas húmidas na Terceira e deste modo regular a disponibilidade hídrica. A água armazenada na turfeira arroteada, que exemplificou, era superior à capacidade da Lagoa artificial do Cabrito.
Etiquetas: Cândida Mendes, Cota Rodrigues, Dinis Pereira, Eduardo Brito de Azevedo, Emília Novo, Falta de água, Félix Rodrigues, Hidrogeologia, João Madruga, Semana da Ciência e Tecnologia
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