Ruralidade em Contexto Insular: a sustentabilidade edificada ao ritmo dos afectos
Foi apresentada e defendida no Campus de Angra do Heroísmo da Universidade dos Açores a tese de Mestrado em Educação Ambiental de Eva Maria de Jesus Ferreira Vidal, intitulada " A Ruralidade em Contexto Insular: a sustentabilidade edificada ao ritmo dos afectos". A tese foi orientada pela Professora Cristina Palos do Departamento de Ciências da Educação e o Professor Félix Rodrigues do Departamento de Ciências Agrárias.
O júri foi constituído pelo Doutor Tomaz Lopes Cavalheiro Ponce Dentinho, professor auxiliar da Universidade dos Açores (por designação do Magnífico Reitor), pela Doutora Rosalina Maria de Almeida Gabriel, professora auxiliar da Universidade dos Açores, pelo Doutor António Félix Flores Rodrigues, professor auxiliar da Universidade dos Açores, pela Doutora Ana Cristina Pires Palos, professora auxiliar da Universidade dos Açores e pelo Doutor Abílio Amiguinho, professor adjunto da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Portalegre.
Este foi o desafio de lançar um olhar diferente sobre o processo de desenvolvimento do espaço rural que passa por perspectivá-lo com um processo articulado, sistémico e localmente assumido.A investigação empreendida aborda as problemáticas do espaço rural, onde este parece estar a modificar-se ou a reconfigurar-se para poder responder aos desafios da actual sociedade de informação e do conhecimento. Surge da necessidade de analisar o rural na sua variedade e complexidade e de repensar o lugar que ocupa no sistema social regional e global.A interpretação desse universo simbólico - a ruralidade insular – tornou consciente a necessidade de aproveitar as oportunidades do presente para perspectivar directrizes para o futuro.No âmbito da investigação, procurou-se desocultar as características e dinâmicas da ruralidade que se evidenciam na freguesia do Raminho, da ilha Terceira. Exploraram-se as potencialidades do património natural e construído (recursos naturais, físicos, geomorfológicos, humanos, institucionais) e do património cultural (usos e costumes, festividades, tradições)l da freguesia; identificaram-se os principais problemas ou prioridades de intervenção; dão-se a conhecer as dinâmicas culturais e as formas de organização social. Procurou-se também interpretar os sentidos que os seus residentes (incluindo o poder político local) atribuem ao território, como o gerem ou partilham. Procurando contornar as explicações que consideram o “atraso”do rural como obstáculo ao “progresso” e ao desenvolvimento e perpassar as visões reducionistas e dicotómicas entre rural e urbano, campo e cidade, tradicional e moderno, aponta-se para as novas configurações entre estas dimensões e sugere-se a emergência de uma nova visão do rural pela revalorização deste espaço e a construção da ruralidade como modus vivendi, na actualidade.Não deixa de ser interessante verificar a duplicidade de posições em que os espaços rurais têm sido, historicamente, colocados. No passado desencadeavam processos de saída ou repulsão das suas populações, atraídas pelo modo de vida urbano; na actualidade parece estar a acontecer uma inversão deste sentido, constituindo os centros urbanos pólos de repulsão de alguns sectores populacionais que reconquistam o campo (apesar de este movimento ser, obviamente, menos massificado do que o anterior).As afinidades que se estão a evidenciar entre as pessoas e o espaço rural parecem estar associadas ao sentido de perda de identidades nas nossas sociedades que se deve a uma ruptura cada vez mais profunda dos laços entre o espaço e as condições ecológicas de reprodução social e, por outro lado, as dinâmicas socioeconómicas de uso dos recursos.No cenário de uma longa evolução, através da qual o campo reencontra novas funções simbólicas, em que passa a ser apreendido nas suas componentes biofísicas como natureza (como lugar de repouso, de tranquilidade, de contemplação), perde progressivamente a conotação de atraso e de subdesenvolvimento, desvirtuando-se da sua função produtiva (agrícola) para se constituir como natureza intocada, como fruição, em alternativa aos ambientes construídos e artificiais das cidades.Inscreve-se como preocupação deste trabalho a perspectiva da sustentabilidade social, económica, ambiental e cultural do espaço rural em apreço (freguesia do Raminho), perante os desafios presentes e futuros que se lhes deparam.As perspectivas sobre o rural, naquilo que são as suas novas vocações, oscilam entre a persistência de uma visão ainda identificada quase exclusivamente com o crescimento económico, a modernização tecnológica e a identificação da ruralidade com a produção agro-pecuária na procura do permanente aumento de produtividade. O rural, nesta óptica, parece passar mais pela involução em processos de desenvolvimento, posição com a qual discordamos; perfilhamos uma perspectiva de desenvolvimento que seja capaz de compatibilizar tradição e modernidade, incorporando muitos dos valores rurais ou amenidades rurais – como surge na terminologia da OCDE (1993) – como forma de alcançar o crescimento económico, maior bem-estar e melhor qualidade de vida das populações rurais. Do Território às Dinâmicas Demográficas, Económicas e SociaisDe acordo com os resultados dos últimos censos de 2001, a freguesia do Raminho tinha uma população residente de 550 habitantes. Entre 1981 e 2001, ocorreu uma redução de 17% da população residente, o que em termos absolutos representa a perda de 113 pessoas, situação distinta da que aconteceu no concelho e na ilha em que a variação da população residente é positiva. A taxa de analfabetismo verificada na freguesia supera a do concelho. Apenas 7,5 % da população possui o ensino secundário completo, contra cerca de 78% que possui o ensino básico. Numa freguesia onde predomina a faixa etária dos 25-64 anos, existe um baixo nível de qualificação da população, embora se verifica um crescimento pouco significativo da população que frequenta o ensino universitário e que representa 2,4% da população.Enquanto na ilha e no concelho não se verifica, nesta década, uma mudança na estrutura do emprego da população activa, no Raminho essa mudança é bastante notória. O sector secundário e terciário ganham uma importância acrescida na estrutura do emprego da população activa local.O sector primário que integrava, em 1991, 54,2 % da população já só empregava, em 2001, 25,2% dessa população.Os resultados da investigação evidenciam que existe uma sua forte ligação afectiva dos residentes à freguesia.Nota-se que os factores que explicam a vinculação à freguesia fazem referência aos laços matrimoniais, ao emprego local e à história de vida associada ao local: lugar onde habita e onde tem as suas ligações afectivas.As razões que os fazem permanecer no Raminho são os grupos de pertença e as redes de sociabilidade local que prevalecem de uma forma ainda muito significativa.Os indivíduos que valorizam estas dimensões atribuem uma forte conotação às suas raízes.Os habitantes têm a percepção dos aspectos únicos da localidade que permitem distingui-la positivamente das outras, com destaque pela a paisagem, a proximidade com a natureza, a beleza, a calma e a tranquilidade são as características mais significativas que a maioria dos indivíduos entrevistados associam ao Raminho, referindo-se ao espaço deste modo: «É um lugar calmo para se viver, onde as pessoas se sentem bem.» «um estilo de vida tranquilo» sinónimo de qualidade de vida «temos mais qualidade de vida». O que pode explicar estarmos em presença do fenómeno da recriação da ruralidade inserido na filosofia pós-moderna da redescoberta e revalorização do espaço rural.Prevalece o “espírito de lugar” em que a noção de lugar transcende as coordenadas geográficas para “veicular a ideia - e o ideal – de “raízes” e de um “enraizamento”. O património é, acima de tudo, uma representação dos ideais de singularidade e de continuidade. E poderá vir a potenciar ou a funcionar como “vector de novas identidades e de novas sociabilidades e, nesse sentido, ajudar à emergência de novas dinâmicas locais” conducentes ao desenvolvimento ou promoção do lugar. As características das pessoas e das relações interpessoais referidas pela amostra da população.No caso específico da freguesia, a organização social e o tipo de relações estabelecidas localmente apresentam ainda traços comunitários e reflectem bem a prevalência dos valores reconhecidos ao rural, enquanto marcas que perduram inegavelmente no tempo, enquanto códigos culturais transmitidos de geração em geração. O Raminho autodefine-se de modo particular pelo interconhecimento na perspectiva dos entrevistados. A hospitalidade e a capacidade de acolher bem as pessoas são, para metade dos participantes no estudo, valores reconhecidos ao Raminho.Admite-se que as relações de vizinhança e de cooperação são integradas e significantes no quadro de vida da população agora ajustadas a novas concepções e modos de viver. A configuração das relações intergeracionais e o reforço activo dos laços e solidariedades intergeracionais são referidos por um quarto dos entrevistados, em que os saberes ancestrais são legitimados pelos jovens da freguesia, no contexto da diversidade cultural e social actual, em que os múltiplos saberes se cruzam e acontecem no intercâmbio entre os actores sociais. É manifesto, nos discursos verbalizados pela totalidade dos entrevistados, a aceitação dos “intrusos”, principalmente, se forem visitantes e estiverem de passagem. A integração plena dos novos residentes na comunidade apenas é facilitada quando por laços matrimoniais ou situação de emprego na freguesia, ainda que a vinda seja reconhecida como benéfica para o equilíbrio etário da população e surja como uma possibilidade de revitalização demográfica. A tendência das respostas indica também que, a freguesia poderá estar a exercer um novo poder de atractividade, pelas características espaciais e simbólicas que pode oferecer como alternativa aos meios urbanos. No caso particular do Raminho, a execução e melhoria das vias de comunicação e rodoviárias terão contribuído para que este se tenha tornado um lugar mais atractivo, em termos residenciais, porque agora está integrado em circuitos de maior mobilidade que favorecem a aproximação e a ligação a outros lugares, o que torna este espaço mais aberto. Outro aspecto interessante dos resultados obtidos no estudo destas questões resulta de que, ao contrário do que se poderia supor, nenhum dos entrevistados revelou atracção pelo modo de vida dos centros urbanos da ilha, Angra do Heroísmo ou Praia da Vitória. Constata-se, aliás, ser percepção destes indivíduos que a qualidade de vida na sua freguesia é melhor do que na cidade.Uma análise mais detalhada, relativamente à freguesia, permite verificar que existem problemas diferenciados e relevantes a vários níveis. Perspectiva-se para a freguesia a necessidade de impulsionar a diversificação da economia, isto é, a criação de actividades e serviços promotores de emprego na localidade do Raminho, não só para fixar a população como para revitalizar o desenvolvimento local, o que passará ainda pela capacidade de rentabilizar melhor os recursos presentes neste território. Antes de se direccionarem projectos é fundamental saber contextualizá-los, respeitar as idiossincrasias locais e articular a participação dos diferentes intervenientes em propostas de requalificação. É importante o reconhecimento dos seus direitos, experiências, saberes e, principalmente, o entendimento de que são os sujeitos que aí habitam que detêm responsabilidades na manutenção e gestão do seu espaço. Na ânsia de padronizar modelos ou concepções dominantes na nossa sociedade e de materializar planos de acção, estratégias e projectos, orientamo-nos para destinatários idealizados, escusamo-nos a recolher os significados e os sentidos de pensar e de agir, as perspectivas da população acerca dos problemas e das potencialidades do seu território, das suas expectativas e posições. Quando, na verdade, o que é necessário é situar e articular acções que enquadrem uma intervenção coerente daquilo que são os interesses e valores locais.Do ponto de vista do educador ambiental faz todo o sentido uma análise da realidade que não esconda antes enfatize as necessidades e problemas locais, mas não querendo apenas desqualificar ou desvalorizar fragilidades e carências da freguesia, deve-se apostar nas potencialidades, nos recursos e nas mais valias funcionais do espaço e dos seus habitantes, bem como, na mobilização colectiva dos actores locais, como condição necessária ao reconhecimento de um património comum, das raízes, das identidades, das idiossincrasias e, na convicção de que, a plataforma de desenvolvimento tem muitas probabilidades de se desencadear a partir dessa conjugação positiva de sinergias. O (des)envolvimento sustentável do Raminho é possível, assim como também é possível encontrar um sentido de futuro, mas para que uma intervenção local seja aceite e legitimada pela comunidade terá que ser a expressão de um projecto colectivo e mediado em permanência e não resultado da simples imposição a partir de fora, devendo dar-se primazia ao agir com os cidadãos. A lógica da Agenda 21 local parece estar subjacente às ideias professadas pela participantes no estudo. Interessa que as autoridades locais a dinamizem, acreditando-se que, pela manifesta vontade de participação da população, os resultados serão promissores para a sustentabilidade do Raminho.
"Dobra-se a curva da estrada corrente e abre-se uma planície de pastagens rasgadas por uma lâmina de casas. O sol do norte dá-lhe a luminosidade límpida dos tempos e das gentes. A seus pés, o mar não desiste duma posse impossível. Raminho dos Folhadais de seu nome – terra da fertilidade e dos afectos." (Álamo de Oliveira)
O júri foi constituído pelo Doutor Tomaz Lopes Cavalheiro Ponce Dentinho, professor auxiliar da Universidade dos Açores (por designação do Magnífico Reitor), pela Doutora Rosalina Maria de Almeida Gabriel, professora auxiliar da Universidade dos Açores, pelo Doutor António Félix Flores Rodrigues, professor auxiliar da Universidade dos Açores, pela Doutora Ana Cristina Pires Palos, professora auxiliar da Universidade dos Açores e pelo Doutor Abílio Amiguinho, professor adjunto da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Portalegre.
Este foi o desafio de lançar um olhar diferente sobre o processo de desenvolvimento do espaço rural que passa por perspectivá-lo com um processo articulado, sistémico e localmente assumido.A investigação empreendida aborda as problemáticas do espaço rural, onde este parece estar a modificar-se ou a reconfigurar-se para poder responder aos desafios da actual sociedade de informação e do conhecimento. Surge da necessidade de analisar o rural na sua variedade e complexidade e de repensar o lugar que ocupa no sistema social regional e global.A interpretação desse universo simbólico - a ruralidade insular – tornou consciente a necessidade de aproveitar as oportunidades do presente para perspectivar directrizes para o futuro.No âmbito da investigação, procurou-se desocultar as características e dinâmicas da ruralidade que se evidenciam na freguesia do Raminho, da ilha Terceira. Exploraram-se as potencialidades do património natural e construído (recursos naturais, físicos, geomorfológicos, humanos, institucionais) e do património cultural (usos e costumes, festividades, tradições)l da freguesia; identificaram-se os principais problemas ou prioridades de intervenção; dão-se a conhecer as dinâmicas culturais e as formas de organização social. Procurou-se também interpretar os sentidos que os seus residentes (incluindo o poder político local) atribuem ao território, como o gerem ou partilham. Procurando contornar as explicações que consideram o “atraso”do rural como obstáculo ao “progresso” e ao desenvolvimento e perpassar as visões reducionistas e dicotómicas entre rural e urbano, campo e cidade, tradicional e moderno, aponta-se para as novas configurações entre estas dimensões e sugere-se a emergência de uma nova visão do rural pela revalorização deste espaço e a construção da ruralidade como modus vivendi, na actualidade.Não deixa de ser interessante verificar a duplicidade de posições em que os espaços rurais têm sido, historicamente, colocados. No passado desencadeavam processos de saída ou repulsão das suas populações, atraídas pelo modo de vida urbano; na actualidade parece estar a acontecer uma inversão deste sentido, constituindo os centros urbanos pólos de repulsão de alguns sectores populacionais que reconquistam o campo (apesar de este movimento ser, obviamente, menos massificado do que o anterior).As afinidades que se estão a evidenciar entre as pessoas e o espaço rural parecem estar associadas ao sentido de perda de identidades nas nossas sociedades que se deve a uma ruptura cada vez mais profunda dos laços entre o espaço e as condições ecológicas de reprodução social e, por outro lado, as dinâmicas socioeconómicas de uso dos recursos.No cenário de uma longa evolução, através da qual o campo reencontra novas funções simbólicas, em que passa a ser apreendido nas suas componentes biofísicas como natureza (como lugar de repouso, de tranquilidade, de contemplação), perde progressivamente a conotação de atraso e de subdesenvolvimento, desvirtuando-se da sua função produtiva (agrícola) para se constituir como natureza intocada, como fruição, em alternativa aos ambientes construídos e artificiais das cidades.Inscreve-se como preocupação deste trabalho a perspectiva da sustentabilidade social, económica, ambiental e cultural do espaço rural em apreço (freguesia do Raminho), perante os desafios presentes e futuros que se lhes deparam.As perspectivas sobre o rural, naquilo que são as suas novas vocações, oscilam entre a persistência de uma visão ainda identificada quase exclusivamente com o crescimento económico, a modernização tecnológica e a identificação da ruralidade com a produção agro-pecuária na procura do permanente aumento de produtividade. O rural, nesta óptica, parece passar mais pela involução em processos de desenvolvimento, posição com a qual discordamos; perfilhamos uma perspectiva de desenvolvimento que seja capaz de compatibilizar tradição e modernidade, incorporando muitos dos valores rurais ou amenidades rurais – como surge na terminologia da OCDE (1993) – como forma de alcançar o crescimento económico, maior bem-estar e melhor qualidade de vida das populações rurais. Do Território às Dinâmicas Demográficas, Económicas e SociaisDe acordo com os resultados dos últimos censos de 2001, a freguesia do Raminho tinha uma população residente de 550 habitantes. Entre 1981 e 2001, ocorreu uma redução de 17% da população residente, o que em termos absolutos representa a perda de 113 pessoas, situação distinta da que aconteceu no concelho e na ilha em que a variação da população residente é positiva. A taxa de analfabetismo verificada na freguesia supera a do concelho. Apenas 7,5 % da população possui o ensino secundário completo, contra cerca de 78% que possui o ensino básico. Numa freguesia onde predomina a faixa etária dos 25-64 anos, existe um baixo nível de qualificação da população, embora se verifica um crescimento pouco significativo da população que frequenta o ensino universitário e que representa 2,4% da população.Enquanto na ilha e no concelho não se verifica, nesta década, uma mudança na estrutura do emprego da população activa, no Raminho essa mudança é bastante notória. O sector secundário e terciário ganham uma importância acrescida na estrutura do emprego da população activa local.O sector primário que integrava, em 1991, 54,2 % da população já só empregava, em 2001, 25,2% dessa população.Os resultados da investigação evidenciam que existe uma sua forte ligação afectiva dos residentes à freguesia.Nota-se que os factores que explicam a vinculação à freguesia fazem referência aos laços matrimoniais, ao emprego local e à história de vida associada ao local: lugar onde habita e onde tem as suas ligações afectivas.As razões que os fazem permanecer no Raminho são os grupos de pertença e as redes de sociabilidade local que prevalecem de uma forma ainda muito significativa.Os indivíduos que valorizam estas dimensões atribuem uma forte conotação às suas raízes.Os habitantes têm a percepção dos aspectos únicos da localidade que permitem distingui-la positivamente das outras, com destaque pela a paisagem, a proximidade com a natureza, a beleza, a calma e a tranquilidade são as características mais significativas que a maioria dos indivíduos entrevistados associam ao Raminho, referindo-se ao espaço deste modo: «É um lugar calmo para se viver, onde as pessoas se sentem bem.» «um estilo de vida tranquilo» sinónimo de qualidade de vida «temos mais qualidade de vida». O que pode explicar estarmos em presença do fenómeno da recriação da ruralidade inserido na filosofia pós-moderna da redescoberta e revalorização do espaço rural.Prevalece o “espírito de lugar” em que a noção de lugar transcende as coordenadas geográficas para “veicular a ideia - e o ideal – de “raízes” e de um “enraizamento”. O património é, acima de tudo, uma representação dos ideais de singularidade e de continuidade. E poderá vir a potenciar ou a funcionar como “vector de novas identidades e de novas sociabilidades e, nesse sentido, ajudar à emergência de novas dinâmicas locais” conducentes ao desenvolvimento ou promoção do lugar. As características das pessoas e das relações interpessoais referidas pela amostra da população.No caso específico da freguesia, a organização social e o tipo de relações estabelecidas localmente apresentam ainda traços comunitários e reflectem bem a prevalência dos valores reconhecidos ao rural, enquanto marcas que perduram inegavelmente no tempo, enquanto códigos culturais transmitidos de geração em geração. O Raminho autodefine-se de modo particular pelo interconhecimento na perspectiva dos entrevistados. A hospitalidade e a capacidade de acolher bem as pessoas são, para metade dos participantes no estudo, valores reconhecidos ao Raminho.Admite-se que as relações de vizinhança e de cooperação são integradas e significantes no quadro de vida da população agora ajustadas a novas concepções e modos de viver. A configuração das relações intergeracionais e o reforço activo dos laços e solidariedades intergeracionais são referidos por um quarto dos entrevistados, em que os saberes ancestrais são legitimados pelos jovens da freguesia, no contexto da diversidade cultural e social actual, em que os múltiplos saberes se cruzam e acontecem no intercâmbio entre os actores sociais. É manifesto, nos discursos verbalizados pela totalidade dos entrevistados, a aceitação dos “intrusos”, principalmente, se forem visitantes e estiverem de passagem. A integração plena dos novos residentes na comunidade apenas é facilitada quando por laços matrimoniais ou situação de emprego na freguesia, ainda que a vinda seja reconhecida como benéfica para o equilíbrio etário da população e surja como uma possibilidade de revitalização demográfica. A tendência das respostas indica também que, a freguesia poderá estar a exercer um novo poder de atractividade, pelas características espaciais e simbólicas que pode oferecer como alternativa aos meios urbanos. No caso particular do Raminho, a execução e melhoria das vias de comunicação e rodoviárias terão contribuído para que este se tenha tornado um lugar mais atractivo, em termos residenciais, porque agora está integrado em circuitos de maior mobilidade que favorecem a aproximação e a ligação a outros lugares, o que torna este espaço mais aberto. Outro aspecto interessante dos resultados obtidos no estudo destas questões resulta de que, ao contrário do que se poderia supor, nenhum dos entrevistados revelou atracção pelo modo de vida dos centros urbanos da ilha, Angra do Heroísmo ou Praia da Vitória. Constata-se, aliás, ser percepção destes indivíduos que a qualidade de vida na sua freguesia é melhor do que na cidade.Uma análise mais detalhada, relativamente à freguesia, permite verificar que existem problemas diferenciados e relevantes a vários níveis. Perspectiva-se para a freguesia a necessidade de impulsionar a diversificação da economia, isto é, a criação de actividades e serviços promotores de emprego na localidade do Raminho, não só para fixar a população como para revitalizar o desenvolvimento local, o que passará ainda pela capacidade de rentabilizar melhor os recursos presentes neste território. Antes de se direccionarem projectos é fundamental saber contextualizá-los, respeitar as idiossincrasias locais e articular a participação dos diferentes intervenientes em propostas de requalificação. É importante o reconhecimento dos seus direitos, experiências, saberes e, principalmente, o entendimento de que são os sujeitos que aí habitam que detêm responsabilidades na manutenção e gestão do seu espaço. Na ânsia de padronizar modelos ou concepções dominantes na nossa sociedade e de materializar planos de acção, estratégias e projectos, orientamo-nos para destinatários idealizados, escusamo-nos a recolher os significados e os sentidos de pensar e de agir, as perspectivas da população acerca dos problemas e das potencialidades do seu território, das suas expectativas e posições. Quando, na verdade, o que é necessário é situar e articular acções que enquadrem uma intervenção coerente daquilo que são os interesses e valores locais.Do ponto de vista do educador ambiental faz todo o sentido uma análise da realidade que não esconda antes enfatize as necessidades e problemas locais, mas não querendo apenas desqualificar ou desvalorizar fragilidades e carências da freguesia, deve-se apostar nas potencialidades, nos recursos e nas mais valias funcionais do espaço e dos seus habitantes, bem como, na mobilização colectiva dos actores locais, como condição necessária ao reconhecimento de um património comum, das raízes, das identidades, das idiossincrasias e, na convicção de que, a plataforma de desenvolvimento tem muitas probabilidades de se desencadear a partir dessa conjugação positiva de sinergias. O (des)envolvimento sustentável do Raminho é possível, assim como também é possível encontrar um sentido de futuro, mas para que uma intervenção local seja aceite e legitimada pela comunidade terá que ser a expressão de um projecto colectivo e mediado em permanência e não resultado da simples imposição a partir de fora, devendo dar-se primazia ao agir com os cidadãos. A lógica da Agenda 21 local parece estar subjacente às ideias professadas pela participantes no estudo. Interessa que as autoridades locais a dinamizem, acreditando-se que, pela manifesta vontade de participação da população, os resultados serão promissores para a sustentabilidade do Raminho.
"Dobra-se a curva da estrada corrente e abre-se uma planície de pastagens rasgadas por uma lâmina de casas. O sol do norte dá-lhe a luminosidade límpida dos tempos e das gentes. A seus pés, o mar não desiste duma posse impossível. Raminho dos Folhadais de seu nome – terra da fertilidade e dos afectos." (Álamo de Oliveira)
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