Factos de 2007
Este ano, contrariamente aquilo que é costume fazer neste jornal, A União, explicitando os acontecimentos mais importantes do ponto de vista regional, nacional e internacional, optei por seleccionar os acontecimentos que, naturalmente do meu ponto de vista, foram mais importantes para os açorianos independentemente do local e da escala onde ocorrem.
O desenvolvimento da China pode ter mais impacto na vida dos açorianos do que a propaganda em torno da Presidência Europeia protagonizada pelo Governo Português, as decisões sobre aquecimento global assumidas em Bali podem gerar mais efeitos no bem estar dos terceirenses do que qualquer anúncio de subsídio à agricultura.
ECONOMIA
O preço do petróleo atingiu os máximos históricos neste ano resultado de um aumento sustentado da procura, fruto de uma oferta menos dinâmica e devido a persistentes preocupações geopolíticas nos países produtores de petróleo. Os preços dos bens alimentares também subiram acentuadamente durante o ano de 2007. E o preço dos lacticínios nos mercados internacionais mais que duplicou ao longo dos últimos dois anos. A expectativa é que a subida de preços dos alimentos se irá manter. Primeiro, porque o aumento da procura de biocombustíveis criará mais pressão sobre os produtos agrícolas. Segundo, porque devido ao aquecimento global continuará a haver mais períodos de seca e maior risco de difusão de doenças dos animais. Finalmente porque o crescimento de países muito populosos como a Índia e a China continuará a sustentar um aumento generalizado dos preços dos alimentos e dos combustíveis.
Qual o impacto destes aumentos dos preços na vida das pessoas?Os agricultores e industriais ligados de forma competitiva aos mercados internacionais sairão beneficiados; neste sentido Casimiro de Almeida, industrial de lacticínios no Continente português, em Espanha e nos Açores tem razões para estar contente. No entanto as populações mais pobres em todo o mundo, nomeadamente as populações em torno das grandes cidades, terão dificuldade em lidar com o aumento do preço dos alimentos e com o aumento do preço dos transportes; neste caso cresce a importância de iniciativas como o Banco Alimentar contra a Fome coordenadas por Isabel Jonet.
Finalmente as pessoas mais preocupadas com o ambiente e a biodiversidade assistirão a um aumento da pressão agrícola sobre zonas naturais ou de produção extensiva; e é assim que ganharão peso a educação e a formação em engenharia e gestão do ambiente, como tem sido defendido pelo Professor Félix Rodrigues do Departamento de Ciências Agrárias da Universidade dos Açores.
Nos Açores a grande vantagem do aumento do preço dos lacticínios foi e será arrecadada em grande parte pela indústria transformadora uma vez que os produtores de leite, por falta de uma regulação adequada, continuarão a enfrentar as limitações de quota leiteira e situação de monopsónio que reduzem a sua capacidade negocial.
TECNOLOGIASe colocarmos a frase acima nos motores de busca surge-nos a referência a uma série de textos visionários dos anos oitenta e noventa do século passado. The Information Technology Revolution, de Tom Forrester (1985); The Control Revolution, de James Beniger (1986); The Information Age, de Manuel Castells (1996); até, poderia lembrar o Information Technologies and Regional Development, de Tomaz Dentinho (1995), Professor do Departamento de Ciências Agrárias da Universidade dos Açores. No entanto todos esses livros eram prospectivos, pegando em pequenos sinais que iam ocorrendo, interpretando-os à luz de um qualquer paradigma científico das décadas anteriores e intuindo modificações estruturais nos valores, nas instituições, nos comportamentos, nas tecnologias e no meio ambiente. Em 2007 toda essa literatura passou a ser ficção, um pouco como os textos de Júlio Verne foram para as diversas revoluções industriais. É verdade que as instituições e as regras de jogo ainda não mudaram radicalmente mas o importante é que as pessoas já mudaram, sobretudo as mais novas. Este Natal a maior parte dos presentes oferecidos foram electrónicos. A maior parte dos alunos universitários têm computador portátil. Muito mais casas têm computador e acesso à internet dez anos depois da sua disponibilização do que aquelas que tinham acesso à televisão dez anos depois do surgimento daquele poderoso meio de comunicação. Há várias mudanças estruturais associadas à difusão das novas tecnologias da informação. No entanto, aquela que experimentámos este ano de 2007 é que não se trata de difusão mas de constante reinvenção ditada pelo gosto das pessoas. As inovações não resultam de processos longos de investigação mas de verdadeiros acidentes protagonizados por “idiotas” como Evan Williams, associado à criação do Google, dos Blogs, do iTunes e do, mais recente, o Twitter, que impõe que a informação dada pelos participantes na rede seja uma resposta à pergunta “O que estás a fazer”. A ideia é magnífica porque acrescenta à rede a proximidade que lhe faltava uma vez que o pensar é global e temporal mas o fazer é local e próximo. As ideias novas são difíceis de explicar no início mas todas as inovações parecem óbvias quando olhadas de frente para trás, tal como o ovo de Colombo. Talvez por isso todas estas inovações são rapidamente assumidas pelos mais novos como se todos os seus desejos pudessem ser tornados realidade com o potencial das novas tecnologias da informação.
AMBIENTE
O número de eventos noticiados associados a desastres naturais aumentou de 200 na década de noventa para 400 na década actual. Independentemente da relação entre o aumento destas catástrofes e o aumento registado da temperature do planeta a verdade é que tem crescido a preocupação da população do mundo face aos problemas relacionados com o aquecimento global. De acordo com o Economist as últimas horas da Conferência de Bali sobre Aquecimento Global foram emociantes. De um lado os Americanos e os seus aliados. Do outro os Europeus e os seus apoiantes. Quem salvou a situação foi Kevin Conrald da Papua Nova Guiné que enfrentou os Americanos dizendo ao microfone “Se por alguma razão não são capazes de liderar a resolução deste problema deixem que nós o resolvamos e, por favor, saiam da nossa frente”. O aplauso foi tão forte que a representante dos Estados Unidos teve de alinhar com todos os outros dizendo que “Os Americanos irão para a frente para formar um consenso”. Na verdade nada mudou para além da intensão de implementar um projecto piloto para investigar como paramos com a deflorestação tropical já que tudo o mais ficou à espera dos resultados das eleições americanas do próximo ano. Os únicos avanços são iniciativas regionais como o projecto europeu de fixar limites nas emissões gases dos automóveis ou a proposta da Califórnia em utilizar combustível com baixo conteúdo em carbono. Objectivamente esta não é a melhor forma de resolver o problema pois pode resultar num amontoar de regulamentos demagógicos, contraproducentes e ineficientes como acontece com a maior parte dos regulamentos ambientais.
Qual o impacto destas políticas nos Açores?Por um lado vamos ter preços dos transportes mais elevados pois o combustível a utilizar será mais caro ou mais taxado. Por outro lado temos a grande oportunidade de lançar processos de desenvolvimento baseados em energias alternativas que abundam nas ilhas, como a energia eólica, geotérmica e das ondas. O problema é que a política energética continua a ser dominada pelas entidades mais centralizadoras e monopolistas como a EDP e a EDA. Houvesse coragem política para liberalizar totalmente a produção de energia e certamente os efeitos conseguidos seriam bastante maiores do que aqueles que se têm alcançado. O problema está na organização de mercados de energia renovável e não tanto na adopção de projectos megalómanos e centralizadores de energias renováveis. Entretanto outras questões ambientais menos mediatizados como gestão da água, dos resíduos sólidos e dos recursos marinhos continuarão a gravar-se pois perturbam mais os mais pobres do que os mais ricos.
POLÍTICA
Um dos factos mais revelantes de 2007 foi a comprovação da falência do paradigma do Bloco Central em Portugal. As decisões estratégicas dos governos, como o aeroporto da Ota, têm fundamentos tão fracos que são postos em causa e derrotadas por teses de mestrado e por estudos da confederação do comércio; o sistema bancário privado que julgávamos acima de qualquer suspeita é desmascarado por dois ou três articulistas; a política externa do governo é comandada pela Chanceler Alemã e glorificada como tal; e as acções internas da governação limitam-se a transferir para a esfera privada as Estradas de Portugal, a manter a elevadíssima carga fiscal e a fazer operações de costémica mediatizada com uma arrogante centralização de serviços do Estado. Tudo isto sem que as oposições apresentem soluções alternativas. Tudo isto sem que a comunicação social se reveja. Tudo isto sem que a juventude se manifeste. A solução é emigrar. Nos anos setenta os irlandeses com um nível de desenvolvimento semelhante ao nosso, ganham agora três vezes mais do que nós e crescem a um ritmo mais rápido. Há poucos anos a Grécia tinha um rendimento per capita inferior ao nosso. Agora, de acordo com o Fundo Monetário Internacional, o rendimento per capita grego é 50% superior ao de Portugal. O que é mais grave é que as projecções para 2008 não são nada animadoras nem dá mostras que em 2009 a coisa possa melhorar.
Como é que os Açores se situam neste panorama?
Para que o Partido Socialista ganhe as eleições de 2008 estão previstos aumentos consideráveis das transferência públicas proveninentes do Continente e da Europa. No entanto, é expectável que venha a haver uma redução dessas verbas nos anos subsequentes. E como a evolução do produto regional depende em grande parte da variação das transferências externas não é previsível que o desempenho da economia dos Açores seja muito diferente do desempenho da economia portuguesa. Tanto mais quando o Governo Regional insiste em manter a economia amordaçada com transportes marítimos e aéreos em regime de monopólio, com restrições à produção de leite e com venda dos recursos piscícolas.
(In A União)Etiquetas: Açores, Ambiente, balanço, Economia, Félix Rodrigues, Política, Portugal, tecnologia, Tomaz Dentinho
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