domingo, janeiro 20, 2008

Caracterização das Lagoas do Pico

Estamos na Ilha do Pico para caracterizar os sistemas económicos em torno das pequenas lagoas do seu planalto e a dar o módulo de economia dos recursos naturais do mestrado em gestão e conservação da natureza, levado a cabo pelo Departamento de Ciências Agrárias da Universidade dos Açores. De manhãzinha, ainda com o pequeno jet leg de alguns dias em Lisboa, escrevo-vos estas notas; até às cinco da tarde converso com os lavradores que têm pastos em torno das lagoas graças ao apoio das engenheiras dos serviços agrícolas Benilde Pereira e Rita Ferreira; e à noite, das seis às onze, aborreço os alunos do mestrado com gráficos e equações sobre a economia da terra, da água, das pescas, do ambiente, do petróleo e das florestas. O que vos posso contar hoje tem a ver com a conversa que tivemos com vários lavradores em torno da Ilha. Os tais que utilizam terras em torno das lagoas que agora estão a ser objecto de um Plano de Ordenamento. Da Lagoa do Capitão conversámos com quatro lavradores, três da zona de São Roque e um do lado do sul da Ilha. Um deles tem gado de carne e de leite, este com apenas uma ordenha por dia durante dez meses do ano. Os outros só têm gado de carne. Dois deles são lavradores a tempo inteiro e ainda contam com o apoio da família no maneio de gado. Um terceiro é empregado da EDA e o quarto tem uma pequena serração e carpintaria. Gente de trabalho esta que vive no Pico. O leite é vendido para a cooperativa; há poucos meses estava a 18 cêntimos por litro mas agora já está a 25 cêntimos, graças aos efeitos da procura longínqua dos chineses e aos pagamentos mais elevados de Inverno. O gado de carne é exportado através de vários intermediários e pode render cerca de quatrocentos euros por cabeça. No entanto a maior parte do rendimento vem dos prémios às vacas aleitantes e a outros apoios das medidas agro-ambientais. Os atrasos dos pagamentos do ano passado, já realizados no Continente e em algumas ilhas, começa a levantar alguma revolta. Por outro lado uma das principais preocupações face aos planos das lagoas é a eventual perda dos prémios às vacas aleitantes e de outras medidas ditas agro-ambientais, curiosamente indexadas ao número de cabeças de gado. E é assim que as ditas medidas agro-ambientais provenientes da “sábia” União Europeia e adaptadas pelo Governo Regional provocam mais degradação ambiental do que melhoria. Na verdade os lavradores aumentam o número de cabeças até ao limite do encabeçamento permitido para receberem mais apoios. O resultado é que existe uma mortalidade elevada do gado e a degradação do pasto é fortemente acelerada pelo pisoteio em terras encharcadas e declivosas. Tudo seria diferente se os apoios agro-ambientais fossem de facto para estimular o maneio dos lavradores a produzirem leite e carne mas também água limpa, solo bom, arranjo da paisagem e aumento da biodiversidade. O problema é que os ambientalistas julgam que a produção desses serviços ambientais são melhor protagonizados pelo Governo Regional e pelas Câmaras Municipais. E é assim que assistimos à introdução de patos pelo município degradando a qualidade da água, registamos a introdução de peixe pelo Governo Regional eliminando os pequenos peixes que serviam para ser transladados para os pequenos tanques de água para a limparem, observamos a colocação de placas, de degradados espaços de piquenique, de estradas largas por camionetas de turistas e da manutenção dos arames das cercas do gado; isto em vez de se permitir aos lavradores a criação de muros de pedra e pequenos caminhos de acesso que permitiriam criar uma paisagem com sentido e, ao mesmo tempo, fomentar a visitação de pequenos grupos em caminhos rurais. Não tenho espaço de referir as outras lagoas mas vale a pena reter algumas frases de quem sabe: “A gente já não manda no que é nosso!”; “O Ambiente lixa uns e protege os outros!”; “As leis podem ser boas mas são maus os que as executam!”.
(Prof. Tomaz Dentinho In A União)

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