quarta-feira, janeiro 09, 2008

Tragédia dos comuns nas pescas

A denominação “Tragédia dos Comuns” é conhecida na gíria dos economistas para identificar bens e serviços que são rivais no uso mas que não têm direitos de propriedade bem definidos.
O caso mais exemplar é o pastoreio de baldios. Nesta situação, como o custo de pastoreio do baldio é nulo, cada pastor tem tendência a colocar o maior número de cabras possível no baldio. No entanto, como todos os pastores têm o mesmo comportamento, vão continuar a colocar cabras no baldio até que rendimento líquido de cada um deles lhe dê apenas para pagar o seu salário de subsistência.
Um outro caso paradoxal é o congestionamento de tráfego nas cidades. Neste exemplo se o custo de circular de automóvel na cidade for nulo cada automobilista tende a usar ao máximo a rede viária disponível. Todavia, como todos os outros automobilistas têm a mesma atitude, a cidade vai ficando congestionada até que a vantagem de todos eles de circularem seja nula.
Um terceiro exemplo tem a ver com a poluição atmosférica. Nesta situação o custo de utilizar a atmosfera para diluir as emissões gasosas é zero e, sendo assim, todos os poluidores tendem a emitir para a atmosfera a seu belo prazer. O problema é que todos fazem o mesmo até ao ponto de não haver qualquer vantagem de o fazer e correndo-se o risco de descalabros ambientais.
A exploração do recurso pesqueiro está também sujeita à mesma situação se não houver atribuição de direitos de propriedade. Na verdade, na ausência de direitos como quotas transaccionáveis ou direitos territoriais, todos os pescadores tendem a manter o esforço de pesca enquanto tiverem rendimento. E como todos os pescadores fazem o mesmo, o que tende a acontecer é que o esforço de pesca aumenta até que o rendimento dos pescadores sirva apenas para garantir a sua subsistência. Esta é a razão fundamental pela qual existem comunidades piscatórias empobrecidas. E como o rendimento tende a ser de subsistência a atitude das famílias dos pescadores é colocarem toda a família a trabalhar e terem muitos filhos para que aumentem ainda mais o esforço de pesca. É por esta razão que nos Açores existem 240 mulheres dedicadas à pesca com condições trabalho precárias como denuncia a UMAR. São elas, são os seus maridos e são os seus filhos.
Os locais onde tal acontece são, sintomaticamente, os locais onde não existem muitas alternativas de emprego. E a acrescentar este facto está necessariamente o pagamento diferenciado entre homens e mulheres, e entre mais velhos e mais novos.
Duas questões podem ser levantadas. Por um lado para saber porque razão há comunidades piscatórias que conseguiram obter níveis de desenvolvimento maiores do que outras nos Açores? A razão não tem a ver com o direito de propriedade dos recursos pesqueiros que tende a ser semelhante em todas as ilhas com a existência de livre acesso até à relativamente pouco tempo. A razão tem a ver com a possibilidade de emprego alternativo o que aumenta o custo de oportunidade da actividade piscatória, definindo assim uma espécie de salário mínimo. É isto que acontece em São Mateus e no Corvo mas não ocorre em Rabo de Peixe ou na Ribeira Quente.
Por outro lado é fundamental saber o que pode ser feito em termos de política? As medidas são de alguma forma óbvias tendo em atenção o exposto atrás e considerando o que vai ocorrendo de bom e de mau por todo o mundo. Em primeiro lugar é essencial definir direitos de propriedade sobre os recursos marinhos. E aí é preciso excluir desde logo todos os pescadores que são provenientes de fora da circunscrição de cada porto pesqueiro. Depois é importante criar empregos alternativos no turismo, na administração e na indústria como se faz em São Mateus. Finalmente há que ganhar valor ao longo da cadeia logística até ao restaurante de peixe de Madrid, Tóquio e Nova Iorque.


(Prof. Tomaz Dentinho In A União)

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