segunda-feira, janeiro 07, 2008

Mercado e evolução do preço do leite

Foi há uns anos que escrevi sobre o temor crescente face às exportações chinesas. Nessa altura disse que só havia vantagens. Por um lado porque todos passámos a ter acesso a bens e serviços mais baratos. Por outro lado porque, mais tarde ou mais cedo, teríamos a oportunidade de vender produtos para a China pois o seu aumento do rendimento iria certamente reflectir-se num aumento de procura. Os resultados aí estão. Os preços do leite estão a aumentar e com eles aumenta também o rendimento da lavoura dos Açores e, pelo efeito multiplicador, também o rendimento e bem-estar de todos os açorianos. É verdade que a indústria têxtil e de calçado tem problemas no Norte de Portugal mas esse é o resultado incontornável dos sectores protegidos artificialmente pela desvalorização do escudo e pelos acordos de comércio preferencial com os países europeus que terminou há anos.
A lição a tirar é que outros sectores igualmente protegidos como os transportes aéreos e marítimos para os Açores também têm os dias contados mais tarde ou mais cedo. Não sei porque razão é que insistem em manter essas concessões se a única consequência que tem é reduzir o turismo e o rendimento dos açorianos e protelar a necessidade de reestruturação desse sector.
Mas voltemos ao leite. A verdade é que o aumento continuado do preço do leite também vem demonstrar que estavam bastante errados os que lutavam contra a monocultura e pela criação de um novo ciclo económico ligado ao turismo. Talvez agora já estejam arrependidos de estarem a destruir bom solo agrícola com mau ordenamento urbano e com enormes auto - estradas que implicam a destruição de muita terra boa. Os especialistas dizem que o aumento do preço de leite no mercado internacional tem várias causas. Primeiro o aumento da procura de lacticínios na China, na Rússia e na América Latina. Em segundo lugar a política de quotas implementada pela União Europeia desde 1984 e a incapacidade de aumentar de um momento para o outro a produção de leite de forma significativa. Em terceiro lugar a redução das exportações da Austrália devido às vagas de calor, e da Argentina e da Índia que impuseram limites à exportação de leite em pó. Finalmente o aumento do preço das rações que provocou uma redução da produção de leite já que o preço do leite ao produtor só veio a reagir mais tarde.
O que se verificará com o aumento do preço das rações e do preço do leite é que a produção passará a ser mais concentrada nas regiões com mais aptidão natural como os Açores. É assim previsível que o preço do leite aumente para os produtores para que estes consigam produzir mais e para que as fábricas possam aumentar a produção de leite em pó para vender para a China. É também normal que, neste ano, a qualidade do leite se tenha deteriorado pois os lavradores preferiram manter gado doente no rebanho em vez de o abater como teriam feito há um ano. Isto antes de se saber as boas notícias vindas do oriente sobre o aumento do preço do leite nos mercados internacionais.
A verdade é que o contexto mudou e que cabe agora redefinir a estratégia do sector, em vez de ficar à espera dos rendimentos que, sem esforço, nos vêm de fora. Na ilha Graciosa já se queixam de terem uma fábrica sem Torre de Secagem para leite em pó pois este tem agora mais saída que o queijo.
É assim fundamental saber quais são as condições de transporte e comercialização de queijo para a China? Qual a apetência dos chineses para os queijos produzidos nos Açores? E quais os melhores canais de distribuição? Também é importante atender às questões ambientais, agora que o preço relativo do leite face ao valor da água das lagoas e dos sistemas de abastecimento de água se altera. A passividade face às mudanças positivas provenientes do exterior é tão tola como a lamúria face às mudanças negativas vindas de fora.

(Prof. Tomaz Dentinho In A União)

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