quarta-feira, fevereiro 06, 2008

A opção por produtos biológicos

É um fim de manhã numa tarde chuvosa de sábado. Descemos as escadas molhadas do Mercado Duque de Bragança, seguimos pela peixaria, onde os vendedores já arrumam as bancas, e viramos à esquerda. É fácil identificar o novo espaço. As letras estão pintadas na parede, entre bocados de verde e uns ramos escuros: “Produtos biológicos”. Além, disso, presos nos cestos de verga, alguns já quase vazios, bocados de papel tiram as dúvidas: “Kiwi biológico”, “Laranja Biológica”, “Repolho biológico”... Todos os produtos são certificados, garante Francisco Dinis, investigador do Departamento de Ciências Agrárias da Universidade dos Açores e empresário que se encontra à frente do novo estabelecimento. Explica que tudo começou em 2005, com um grupo de pessoas, que se “preocupava com o assunto”. “Começámos a trabalhar umas terras nas Doze Ribeiras, mas de uma forma esporádica. No Verão fazia-se algumas coisas... Mas, aos poucos, fomo-nos organizando e as ideias foram-se definindo. Além disso, trabalho já desde 2005 com a BioFontinhas. Ia lá todos os sábados e aprendia sempre alguma coisa”. Muitos membros desse primeiro grupo eram estudantes universitários, que depois se foram embora, mas os alicerces para o projecto estavam lançados. Francisco Dinis explica o que se pretende: “A nossa ideia é pôr as coisas a andar na Terceira. Depois, vamos contactando os diferentes agricultores. Com alguns produtos de cada, já conseguimos alguma variedade. E isso é o que as pessoas querem. Existem já a BioFontinhas, a BioBiscoitos, uma senhora em São Mateus também tem produtos certificados e há a Quinta do Martelo, que é mais para consumo interno. Mas, agora que começámos neste espaço, apareceram pessoas jovens que têm terrenos da família e que estão interessadas em desenvolver agricultura biológica. Vêem que há esta banca e que existem consumidores e acreditam que é possível apostar neste ramo. Esse é um dos nossos grandes objectivos e as coisas estão-se a mexer”. O próximo passo para pôr as “coisas a mexer” é a reactivação de uma cooperativa dedicada à agricultura biológica, a BioAzorica. “É uma cooperativa que já existia, mas que nunca avançou. Tínhamos duas hipóteses, ou formávamos uma cooperativa de raiz ou aproveitávamos a estrutura que já existia. Estamos em contacto com os sócios e, em princípio, a maior parte mostrou-se interessada em prosseguir. Para o fim do mês existirá uma Assembleia Geral”. Um dos aspectos inovadores desta cooperativa é o objectivo de unir produtores e consumidores num único organismo. “Queremos fazer uma espécie de registo de todos os potenciais consumidores e estes, ao fazerem parte da cooperativa, terão regalias, como preços especiais. Por outro lado, existindo consumidores, isso é também um estímulo para os agricultores, que têm uma garantia de que vão escoar os produtos”. Outro ideal é estabelecer uma espécie de “economia democrática”. “Podíamos apenas avançar com uma loja, mas, numa cooperativa, todos os produtores, dos mais pequenos aos maiores, têm dividendos e todos têm uma palavra a dizer”. Não têm faltado palavras às pessoas que passam pela banca de produtos biológicos. Muitas já sabem do que se trata, mas bastantes fazem perguntas. “Tiramos sempre todas as dúvidas. Explicamos que se tratam de coisas simples, naturais e saudáveis sem adubos químicos”, explica Francisco Dinis, já há anos ligado ao yoga e à meditação, e para quem a boa alimentação é um elemento muito importante. “As pessoas já sabem os benefícios. Começam normalmente por adquirir produtos biológicos para fazer a sopa para o bebé, ou levam a fruta para os filhos. Pensam sempre primeiro nas crianças. Depois, acabam por consumir também e o hábito estende-se a toda a família. Já muita gente ouviu falar de produtos biológicos”.

AGRICULTURA SAUDÁVEL

Não é difícil saber exactamente o que é agricultura biológica. Uma rápida pesquisa pela Internet esclarece as dúvidas. Em causa está uma cultura saudável: Para o ser humano e para o próprio planeta, visto que a produção de alimentos e produtos animais e vegetais não assenta na utilização de produtos químicos sintéticos, não aceita os alimentos geneticamente modificados e costuma caracterizar-se por um tipo de agricultura sustentável. A atenção é colocada sobre o solo, para aproveitá-lo e fazê-lo produzir eficientemente sem fertilizantes e pesticidas artificiais. Daí resulta outra vantagem, explica Francisco Dinis: “São alimentos saudáveis, com um sabor mais puro. Têm uma qualidade superior aos convencionais, aos simples vegetais ou frutas que se vendem nas prateleiras dos hipermercados”. Em países como o Brasil, Estados Unidos da América, Suíça ou Japão, a agricultura biológica é já regulamentada por lei. O mesmo sucede no seio da União Europeia, o que limita as desconfianças que possam existir em relação a este tipo de produtos. Um argumento contra costuma ser o preço mais elevado, mas Francisco Dinis afasta-o. “O que queremos com esta cooperativa é garantir também preços razoáveis. Pode-se estar a falar de uma ligeira subida em relação aos produtos convencionais, mas não é muito significativa. O poder de compra das pessoas da ilha foi tido em conta”, garante. Naturais e de sabor genuíno, os produtos estão na banca. Cestos de vime claro com laranjas pálidas e ligeiramente mais pequenas, mas de paladar forte, batata-doce, repolho, cenouras, cebola, ovos, compotas de uva e de kiwi... A opção biológica já existe no mercado de Angra.
(In DI - Revista)

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