Biodiversidade de plantas cultivadas- Contributo para o Desenvolvimento Sustentável
Chama-se Germobanco e é um projecto que envolve os Açores, a Madeira e as Canárias. Há três anos que tenta caracterizar e fomentar o cultivo de variedades tradicionais da maçã, do inhame ou da pimenta, características de algumas zonas dos Açores. O catálogo já inclui centenas de variedades. São centenas de variedades tradicionais de dezenas de espécies de frutos, legumes ou mesmo cereais as que já constam do Germobanco açoriano. A intenção é sistematizar um trabalho que já vinha sendo feito isoladamente num verdadeiro registo ao nível da Macaronésia (Açores, Madeira e Canárias) onde, de uma forma científica e virada para os potenciais económicos, se faz um levantamento das variedades tradicionais características de cada uma das regiões, como forma de as preservar e até promover, num mercado alimentar cada vez mais global. Trata-se do projecto Germobanco, financiado pelo programa Interreg IIIB, coordenado pelo Professor Doutor David Horta Lopes e que há três anos nos Açores tem vindo a desenvolver um importante trabalho de preservação do património genético de algumas variedades tradicionais, primeiro na ilha Terceira, hoje também já nas ilhas de São Miguel, Faial, Pico, São Jorge e Santa Maria. Todos já terão ouvido falar, no caso de São Miguel, da maçã das Furnas ou do inhame da Bretanha ou do feijão rolo açoriano. Mas há centenas de exemplos pelas nove ilhas dos Açores. Nalguns casos, são variedades que foram mantidas nas ilhas desde os tempos da colonização e que agora, com a abertura do mercado alimentar ao exterior, perdem valor comercial e, muitas vezes, desaparecem sem que as pessoas possam verdadeiramente explicar como ou porquê.
Preservar as espécies cultivadas também é uma estratégia de preservação da biodiversidade e de contributo para o desenvolvimento sustentável.
O projecto Germobanco pretende precisamente inverter esse processo, como explicou ao Açoriano Oriental o director dos serviços de Desenvolvimento Agrário da Terceira, José António Ávila. “Com a massificação e o manuseamento genético, há uma tendência para padronizar e cada vez mais há menos diversidade. Muitas vezes, a espécie mais produtiva não é a mais saborosa ou a mais bonita. A diversidade constitui um património importante e os países mais desenvolvidos reconhecem que, fruto da selecção, vão perdendo a possibilidade de proceder a novos cruzamentos, porque já perderam as variedades ditas tradicionais”, revelou. Nalguns casos, afirma, “há até situações extremas em que os últimos pés-mães conhecidos de uma determinada variedade se perderam já em todo o lado, só restando os descendentes mantidos no âmbito deste programa”. Existem nos Açores alguns campos experimentais para a preservação das espécies tradicionais. Os serviços de ilha da Secretaria Regional da Agricultura e Florestas disponibilizam terrenos, técnicos e viaturas para garantir a realização deste trabalho. Até porque conhecem o terreno e os produtores tradicionais, em busca da “macieira do trisavô”, por assim dizer, que é um património genético para lá do seu real valor comercial. Em todas as ilhas, há frutas ou legumes típicos de uma freguesia, que resultaram em variedades tradicionais. “É o nosso cofre no meio do Oceano”, admite José António Ávila. “Há vários casos que estão reconhecidos e em que se veio encontrar variedades nos Açores que em muitos outros sítios já desapareceram. Por exemplo, não muito longe daqui, nas Canárias, eles ficaram muito surpreendidos com a variedade que vieram encontrar nos Açores”, revela. Segundo admite este responsável ligado ao projecto Germobanco, “o que é preciso é matéria-prima para trabalhar e isso nós temos. Até do ponto de vista turístico, isso é muito importante, porque conseguimos criar parques e ambientes rurais ainda carregados de um património que já se perdeu em muitos sítios. Pode-se andar pela Europa e ver a mesma macieira, hectares e hectares a fio, enquanto que se chega cá ao Arquipélago Açoriano e se vê macieiras diferentes, com um sabor diferente, que já não se encontra em mais nenhum lado”. Esta semana, recomeçaram as recolhas de material biológico relativas a mais variedades tradicionais. Durante quinze dias, em seis ilhas, serão feitas recolhas de variedades de macieira, castanheiro, milho, inhame ou batata-doce, em busca da preservação do bom sabor dos velhos tempos nos Açores.
Os “Bancos de Germoplasma”, uma iniciativa do projecto GERMOBANCO, contam já com mais de 700 entradas nos Açores, no que diz respeito à recolha de material biológico de espécies vegetais tradicionais do arquipélago. De acordo com o professor da Universidade dos Açores, David Horta Lopes, “isto não significa que tenhamos 700 espécies identificadas, mas estão a ser dados passos importantes no que diz respeito à recolha de material, com um grande peso na recolha de variedades do milho”.O objectivo do projecto é fazer um levantamento das espécies vegetais tradicionais das ilhas, a sua caracterização molecular e multiplicação “in vitro”. “Com o Germobanco III, estendemos a nossa acção às ilhas de Santa Maria, São Miguel, Faial, Pico e São Jorge. Fizemos a recolha de espécies vegetais há cerca de duas semanas. Este projecto, financiado pelo Interreg III-B, tem a ver com a possibilidade de manter colecções activas e passivas de espécies tradicionais fortemente ameaçadas”, explica o presidente da Fruter, responsável pelo projecto nos Açores. Os trabalhos de recolha incidiram sobre as variedades de macieira, castanheiro, milho, inhame e batata-doce, entre outras. Segundo Sieuve de Meneses, já aconteceu “existir uma ou duas plantas, cujo único exemplar desapareceu, mas conseguimos recolher amostras. Se não o tivéssemos feito, era uma espécie extinta”. “Este projecto permite criar bancos genéticos de determinadas variedades. No caso dos transgénicos, podem surgir problemas tão graves que coloquem a espécie em perigo. Nesse caso, temos a espécie original”.O trabalho desenvolvido pode, também, valorizar os próprios produtos agrícolas. “No caso das Canárias, recuperou-se uma espécie antiga de batata, com elevado valor comercial. Os agricultores adquirem as sementes, limpas de doenças, no laboratório, e aumentam o seu lucro”. Quanto ao futuro do projecto, os responsáveis esperam uma política de continuidade. “É um projecto importante para os Açores” que contribui obviamente para o desenvolvimento sustentavel do Arquipélago na medida que promove a conservação da biodiversidade, via valorização das plantas pela "cultura popular", fazendo-se o entrosamento entre o ter, saber usar e racionalizar e potencializar recursos.
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