sexta-feira, dezembro 14, 2007

Periferias e Espaços Rurais

O livro “Periferias e Espaços Rurais”, editado por Tomaz Dentinho docente do Departamento de Ciências Agrárias da Universidade dos Açores e Orlando Rodrigues, Presidente da Sociedade Portuguesa de Estudos Rurais foi apresentado ontem na Associação Agrícola de São Miguel. A obra reúne as actas do II Congresso de Estudos Rurais, realizado em Angra do Heroísmo, e que contou com a presença de mais de 200 pessoas, e onde se apresentaram 35 textos, tendo sido seleccionados 22 desses textos para este livro. A apresentação da obra esteve a cargo de Fernando Lopes, professor universitário e antigo secretário regional da Agricultura, que destacou o facto de o espaço rural ter ganho terreno a outras actividades, nomeadamente vocacionadas para o lazer, em virtude da “reclassificação do uso da terra para estes fins”. Fernando Lopes adiantou que assim como a agricultura teve um impacto que os ambientalistas vêm avaliar, também as novas actividades têm impacto no território, como as urbanizações, os parques industriais e campos de golfe devem ser devidamente avaliadas. Tomaz Dentinho disse que o desenvolvimento rural é uma “problemática interessante porque vai para além da economia, analisando as vilas e aldeias que dependem da agricultura mas que têm vida para além da agricultura”. Segundo referiu, “toda a política de demarcação de áreas protegidas e toda a política ambiental é, “de alguma forma, posta em causa por estes pequenos estudos”.
(In Diário Insular)
Conforme diz o Orlando Rodrigues, co-editor do livro “Periferias e Espaços Rurais”, uma selecção de textos sobre o mundo rural constitui uma oportunidade maior para reequacionar os problemas específicos das regiões periféricas e os mecanismos institucionais, económicos e sociais que, em interacção com as particularidades geográficas e naturais, são responsáveis pelo desenho do espaço, do seu desenvolvimento e das suas desigualdades. A publicação destes trabalhos responde a algumas destas inquietações. Numa primeira parte, mais centrada sobre as questões agrícolas, evidenciam-se sinais de resistência ou de reemergência de actividades e de sectores marginais ou periféricos que podem encerrar um elevado potencial de geração de riqueza e de competitividade pela diferenciação. O que acontecerá às regiões mais periféricas, as zonas de montanha e as ilhas, principalmente as ilhas ditas “de baixo”? Como aprendemos nestes textos os factores de resiliência e de base de desenvolvimento são as gentes, as empresas, as instituições e as tecnologias locais. As pessoas que vivem das reformas e da produção de gado, as empresas que se ligam em redes horizontais e verticais, as instituições como o regime de baldios e as regulações de propriedade, e as tecnologias como as dos lameiros no Norte e dos produtos com denominação de origem. Na segunda parte do livro focam-se os problemas da sustentabilidade ambiental e do próprio ambiente enquanto gerador de riqueza e de produções transaccionáveis no mercado – as amenidades ambientais. O ajustamento das políticas de promoção do ambiente dirigidas a regiões periféricas, em boa parte catalogáveis enquanto políticas de coesão, é largamente discutido ao longo desta parte. Paradoxalmente, o que parece verificar-se é que os grupos que são fortemente contra a criação de áreas protegidas são também aqueles que manifestam uma marcada identidade regional e sentido de pertença. Se associarmos isto ao facto de os grupos ambientais serem também aqueles que têm maior participação pública e que as atitudes face ao meio ambiente da população estão associados aos seus próprios valores, então podemos explicitar a hipótese de que a escolha pública das áreas protegidas carece de ser redefinida, tanto mais que o posicionamento ambiental varia fortemente com as gerações e com as regiões. Por fim, a terceira parte centra-se sobre o social no rural periférico: múltiplas dimensões são aqui esclarecidas, em particular as dinâmicas das redes sociais e os problemas relacionados com a educação, com os idosos e com os fenómenos migratórios. O que se conclui é que os sítios acabam por integrar as pessoas que neles optam por residir, e ao longo desse processo de integração dá-se uma redução das ligações externas dos imigrantes que implicam um aumento das ligações internas.
No lançamento deste livro estiveram presentes o Secretário Regional da Agricultura dos Açores, Noé Rodrigues, o Presidente da Associação de Agricultores da ilha de São Miguel, Jorge Rita e os professores da Universidade dos Açores Mário Fortuna e Fernando Lopes.
Foi uma sessão muito esclarecedora. Por um lado para explicitar os novos conflitos e complementaridades do mundo rural – entre a produção agrícola e a provisão de serviços ambientais, entre o turismo e a especulação própria da expansão das actividades urbanas para o espaço rural. Por outro lado para rever a estratégia de política agrícola para os Açores: foi bom ou mau apoiar as cooperativas nos anos noventa quando acabaram por cair na mão de capital externo à Região? É bom ou mau ter vacas deste tipo ou de outro? Bom é ter uma Região onde pessoas com várias perspectivas se podem sentar à mesma mesa a conversar sobre temas que interessam a todos.

(In A União)

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