CIDADE, CULTURA, UNIVERSIDADE
Francisco Maduro Dias (opinião)
Angra do Heroísmo já é cidade vai a caminho dos cinco séculos. A casca edificada ao longo destes anos mostra os caminhos, os erros, os sonhos, os tempos.Por muito que se julgue que o conjunto construído - o casco, como se diz em castelhano - é que é o principal, de facto ele é apenas a consequência dos modos de pensar e ser; dos divertimentos e dificuldades; das maneiras de se mostrar o que se tem, o que se é, o que se deseja tornar público ou não.As ruas praças e casas são a consequência e o espelho desse ser em comunidade! Por isso, por muito que se acredite na requalificação urbana e na intervenção no construído, como modos de influir nos comportamentos das pessoas eles serão apenas uma possível parte da solução mas não a solução.Porque antes do materialmente construído - ou seja dos actos de civilização -, existe o mundo mental da cultura e dos modelos de viver e ser.É claro que a forma também ajuda!Uma cidade cujos horizontes sempre foram libertos, como Angra antiga é, com ruas a abrir para o mar e o horizonte em qualquer dos rumos cardeais, com muitas e diversas ruas de tendência ortogonal, lógicas e organizadas, tenderá a organizar, por sua vez, a mente de quem aqui vive, trabalha e se diverte.A qualidade do bolo depende da forma mas o bolo que se quer decide qual será essa mesma forma.Enfim, antes de seguir adiante, convém que fique claro que as obras não bastam como motor de mudança e que a vivência cultural de uma cidade ou povoado depende, sobretudo, da organização dos tempos de trabalho e diversão, das distâncias, dos transportes.Por muito que se goste de teatro, com horários de trabalho extenuantes e transportes deficitários, por exemplo, os palcos tenderão a ficar sem muita assistência. É apenas um exemplo.Depois há os modos!Ainda há poucos dias andava pela net o vídeo de um acontecimento cultural bonito, acontecido em Navarra, isso, sim, um verdadeiro acto de cultura, que foi um grupo coral a cantar, de surpresa, árias de ópera, num grande café da cidade, enquanto as pessoas habituais lanchavam a meio da tarde.De novo aqui - como se isso necessitasse de demonstração - se prova que são as pessoas a fazer a cidade, por muito bonito e cuidado que o casco urbano seja.Angra pretende vir a ser uma cidade universitária e de cultura como já o declararam várias vezes os responsáveis. Desejo bonito, desígnio muito interessante, este.Entretanto, do mesmo modo que não basta ter espaços para se ser algo, não basta ter a Universidade às portas para se ser alguma coisa de diferente. A Instituição tem as suas próprias dinâmicas e velocidades. É e será sempre uma organização de pendor científico e de investigação. A transformação em mais valia da vizinhança com a Universidade depende, principalmente, da comunidade e dos actores políticos e sociais da cidade.Importa, com urgência, saber ligar Cidadania com Cultura e com Universidade.Mais que uma questão de dinheiro ou de obra construída, importa organizar e fazer florescer a comunidade acabrunhada que anda por aí hoje.Mudar a tipologia da intervenção cultural importa e temos tantas condições....
(In DI Revista)
(In DI Revista)
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