segunda-feira, abril 04, 2011

O próximo reitor?


Aprofundar a proximidade com as empresas, debater a racionalização do número de unidades orgânicas no seio da instituição e apostar na internacionalização são alguns rumos defendidos por Alfredo Borba, pró-reitor da Universidade dos Açores, que entrou na corrida à reitoria.

O que motivou a avançar com uma candidatura a reitor da Universidade dos Açores (UA)?Para já, houve um movimento dentro da Universidade, de várias pessoas que me solicitaram que eu avançasse. Depois, pensei no assunto e acho que posso dar um contributo à Universidade dos Açores e o que estou a fazer não é mais do que colocar-me à disposição da UA.De que forma a experiência como pró-reitor pode ajudar nesse contributo?Ajuda de certeza, porque há 15 anos que tenho a responsabilidade, primeiro do Departamento de Ciência Agrárias e, nos últimos oito anos, também da pró-reitoria. Nesses 15 anos, fizemos uma mudança grande quer no departamento, quer no campus. O campus hoje é muito diferente do que existia há 15 anos, não só pelos edifícios, mas pelo número de cursos e de alunos. Ultrapassámos a mítica barreira dos mil alunos, que foi sempre um sonho deste campus. Trouxemos cursos da área das Ciências Sociais e das Humanidades para Angra, que estão a ser um sucesso. Podemos, no futuro, sendo que isso vai depender de quem dirigir o departamento, até pensar em cursos do campus de Angra a funcionar em Ponta Delgada ou na Horta, se houver disponibilidade para isso. Foi um processo que, no balanço do positivo e do negativo, foi positivo.A candidatura a reitor, pela primeira vez, é por concurso público.É a primeira vez que se aplica o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior. Nesse regime, a candidatura à reitoria é por concurso público internacional, o que significa que podem haver candidatos de diversos países, desde que falem português.Como encara a possibilidade do próximo reitor da Universidade dos Açores poder ser um estrangeiro, sem qualquer contacto prévio com a realidade açoriana?Pode ser uma experiência positiva. É claro que acarreta grandes riscos, porque essa pessoa não conhecerá o meio, os constrangimentos, a história da instituição. Nesse aspeto, acho que é perigoso. O lado positivo é trazer ideias novas, vindas de outro meio. Em Portugal, às outras universidades houve várias candidaturas exteriores e nunca nenhuma foi eleita. Penso que foi colocado na balança o negativo e o positivo e, nitidamente, o desconhecido, nesta fase, não foi a solução que os conselhos gerais acharam que deviam escolher.Disse já que queria apostar numa cultura de proximidade. Em que é que isto, concretamente, se traduz? Cultura de proximidade traduz-se em duas vertentes principais: A de proximidade interna, na casa, com as unidades orgânicas, com os funcionários, docentes, investigadores, alunos... Acho que há uma necessidade de trocar opiniões e debater internamente muitas questões e isso é importante. Também há outra vertente, que é a da proximidade externa, com a sociedade, quer regional como nacional, mas, neste caso, sobretudo a nível dos Açores. Aqui estamos a falar não só do Governo, das autarquias, da parte política, mas também da proximidade com as empresas. Esta ligação mais estreita com o tecido empresarial é fundamental para o futuro da Universidade e para esta definir as suas prioridades.Como se coloca no terreno essa relação com as empresas? Estamos a falar, por exemplo, da adequação de cursos ao que o mundo empresarial "pede"?Faz-se estabelecendo parcerias e prestando serviços de acordo com o que as empresas necessitam, mas também dando formação nas áreas que são necessárias para o tecido empresarial açoriano. Há vários mecanismos que podem ser explorados e que já o estão a ser... O que estou a enumerar não é nada de completamente novo, mas há que apostar mais em certas vertentes. Deve-se apostar também numa investigação empreendedora, muito prática, nunca deixando, claro, a investigação fundamental, essencial para a sobrevivência da investigação científica na Universidade dos Açores. Isso é, no fundo, o que o Governo nos está a pedir, através da direção regional da Ciência e da Tecnologia: Ligação com o tecido empresarial na investigação. Temos que ir por esse caminho.Falou também já numa reestruturação do ensino. Na última cerimónia de aniversário da UA, que decorreu no campus do Pico da Urze, o reitor Avelino Meneses defendeu que é preciso racionalizar unidades orgânicas no seio da instituição. Concorda?A reestruturação de que falava em termos de ensino era ao nível das unidades curriculares, das disciplinas, como normalmente as chamamos. Acho necessário libertarmos, um pouco, os docentes da excessiva carga horária que têm, por vezes com disciplinas que têm poucos alunos e às vezes podendo haver sinergias entre vários cursos na utilização das mesmas disciplinas. Essa racionalização é a que eu aponto. A que o senhor reitor falou é outra vertente. Tem que haver um debate, para isso, a nível do Conselho Geral. Não é o reitor que faz a alteração dos estatutos. Pode ter ideias, promover debates, mas a alteração dos estatutos cabe ao Conselho Geral, um órgão de governo da Universidade. O debate sobre o futuro das unidades orgânicas e do estatuto da UA tem que ser feito na tal lógica de proximidade, ou seja, começando as unidades orgânicas a debaterem entre si, ouvindo a casa, e depois partir para a ação. Na minha opinião, é algo que tem de seguir esses passos, não é uma imposição que possa surgir de cima para baixo. A casa tem de saber o que é que quer. Temos uma experiência só de dois anos de estatutos. Só ao fim de quatro anos é que é obrigatório alterar os estatutos e, portanto, se o Conselho Geral não decidir fazê-lo antes, daqui a dois anos teremos de fazer uma revisão obrigatória. Aí, a experiência destes anos vai ser fundamental para a tomada de decisão.Mas considera necessária a reestruturação em termos de unidades orgânicas?É preciso haver alguma alteração. Até que ponto é que essa alteração vai, a sua profundidade, é que pode variar... Mas acho que a casa, no seu todo, pensa que é necessário haver alguma alteração. Não é algo de vida ou de morte para o imediato, mas penso que, dentro do prazo normal, teremos de pensar nisso.Uma questão que está na ordem do dia é o futuro das escolas de enfermagem de Angra do Heroísmo e de Ponta Delgada. Que caminho considera que estas instituições podem seguir? Já se falou em fusão, na reconversão de uma delas em escola na área das Ciências da Saúde, num sentido mais amplo...Duas escolas de enfermagem nos Açores não são possíveis em termos da racionalidade da oferta de ensino e de imagem externa da instituição junto das entidades que nos tutelam. Penso que não é possível continuar por muito mais tempo com esta solução. O futuro das escolas de enfermagem tem também de ser debatido internamente e tem de se atingir um consenso, porque também vai ser o Conselho Geral que vai decidir, em última análise, qual é o caminho que vamos seguir. Temos de trilhar um caminho, não tenho dúvida nenhuma e há debates dentro das escolas neste momento e algumas opções já apontadas. Agora, internamente tem que haver uma decisão, para que depois o Ministério a aceite. Várias hipóteses se põem, mas é algo que é relativamente urgente.Defendeu também uma maior internacionalização da Universidade dos Açores. O que acha que falta fazer?Já foi feita muita coisa e pode ser feita muita mais ainda. Estamos a falar de internacionalização em várias perspetivas. Em tornar a UA num polo de atração para estudantes e professores estrangeiros que queiram vir ensinar ou estudar, sobretudo em segundos e terceiros ciclos das áreas de excelência da UA. Falamos numa internacionalização junto das comunidades de língua portuguesa, quer nos PALOPs, no Brasil, Estados Unidos, Bermuda e Canadá, extremamente importantes. Isto faz-se através de programas com esses países, de lecionação conjunta, de atração de alunos e também pela tal investigação, que deve ser de excelência.No campo da investigação, defende-se sobretudo a importância do Mar. Aí também é importante uma internacionalização, até para ganharmos o conhecimento que será decisivo no futuro para o aproveitamento das mais-valias no domínio marítimo?Penso que sim, mas é também um dos pontos que está neste momento com maior expressão e vigor na UA. Toda a investigação sobre as áreas do mar que é feita no Departamento de Oceanografia e Pescas (DOP), no Departamento de Biologia e mesmo aqui no Departamento de Ciências Agrárias, através do LAMTEC, tem uma expressão internacional muito grande. Essa é uma das vias a seguir no futuro. O mar é apontado por todas as entidades e organismos internacionais como uma das apostas do futuro em termos de recursos e os Açores estão numa posição privilegiada.Que outras áreas se assumem como importantes?Temos áreas com grande expressão, como a Vulcanologia, as Ciências Agrárias, a Biodiversidade, a História, a Língua e Literatura, o Desenvolvimento Regional... Não vale a pena elencar todas, mas há áreas prioritárias que já estão ou vão surgir no futuro na UA.Que papel gostava de ver a UA assumir no mandato do próximo reitor?A UA foi uma das promotoras do desenvolvimento da Região. Em 1976, quando foi fundada, o número de técnicos superiores na Região era muito pequeno e a investigação científica nos Açores era incipiente. A UA foi um dos motores da alteração da face dos Açores. Tem de continuar a ser esse motor, de prosseguir na produção de Ciência, de técnicos, para aplicação no terreno. No entanto, não podemos esquecer que a UA está inserida num sistema nacional de ensino superior e até num sistema europeu e que tem de se afirmar, daí o nosso desejo de acentuar a internacionalização da Universidade.

(in Diário Insular)