segunda-feira, abril 18, 2011

Fukushima: Um nome que não se esquecerá

Félix Rodrigues (Opinião)
Após o terramoto e tsunami de 11 de Março no Japão, o mundo solidarizou-se com a desgraça japonesa e depois, quase que entrou em pânico com o descontrolo do complexo nuclear de Fukushima. O medo do nuclear voltou, porque temos a percepção de viver numa aldeia global o que leva a que ninguém pense, neste momento, que está resguardado num “cantinho do céu”. Muitas pessoas estão assustadas com o nuclear e os políticos tem receios de tomar decisões no que respeita a esclarecê-las. Por outro lado, são muitos os comentadores e analistas científicos que acusam a comunicação social de “pregar o medo do nuclear” nos diversos tipos de publicações destinadas ao grande público. O problema do “medo do nuclear” não está naquilo que se diz, mas nas percepções correctas ou incorrectas do ponto de vista científico, que o cidadão comum, alguns jornalistas e cientistas possuem. Por exemplo, num estudo sobre percepção de risco realizado nos Açores em 2007, os dados mostram que há uma elevada percentagem dos auscultados que desconhecem os mecanismos que contribuem para as alterações climáticas, pois consideram que as latas de spray, a energia nuclear e os resíduos radioactivos como factores que contribuem directamente para esse fenómeno, o que não é verdade. Assim sendo, as preocupações com o nuclear podem ser empoladas quando se pensa que também estão relacionadas com a problemática das alterações climáticas. A opinião esporádica de jornalistas ou cientistas pouco contribuiriam para alterar essa percepção pública. Essa será alterada com uma formação ou informação científica adequada da população. Nesse mesmo estudo, 48% dos inquiridos afirmam ter medo do nuclear e 52% das alterações climáticas globais, ou seja, percentagens muito próximas. Quando comparamos esses dados com os receios dos europeus, eles tendem a ser semelhantes. Nesse contexto, a palavra “nuclear” parece provocar medo, ou desconforto psicológico, seja qual for o argumento. As palavras “nuvem radioactiva” mais medo parecem provocar, mesmo que se afirme que não haverá qualquer impacto em termos de saúde pública. Cada problema relacionado com o nuclear tenderá, em termos de percepção de risco, a incrementá-lo, podendo traduzir-se a curto prazo, numa dificuldade de fazer vingar a exploração dessa energia, mesmo que a queiramos considerar alternativa à queima de combustíveis fósseis. A imagem do acidente de Chernobyl ainda está presente na mente de muitos, considerado o pior acidente nuclear até Fukushima. Os incidentes e acidentes de Fukushima passaram da classificação de nível cinco, para nível seis, e muito recentemente foram classificados de nível sete, ou seja, equivalentes a Chernobyl. As decisões energéticas de um país ou região, há alguns anos atrás, eram tomadas pelos políticos. Nas sociedades democráticas com participação pública e respeito pela diversidade de opiniões é um pouco diferente. O discurso público para essas tomadas de decisão era essencialmente retórico, contrário a um discurso científico que rompe com as evidências e “códigos de leitura do mundo” e se constitui num sistema de juízos e de relações entre conceitos. No que respeita ao nuclear, acredita-se que neste momento tanto o discurso retórico como o discurso científico estão fragilizados, havendo necessidade de os fundir se quisermos afirmar a ideia de exploração da energia nuclear. Num contexto moderno e realista de produção científica, percebe-se que tanto a ciência como a sociedade co-evoluem, havendo um elo forte entre ciência e sociedade. É a sociedade que financia a investigação científica e exige dela cada vez mais resultados práticos para a resolução de problemas técnicos ou de produção industrial. Assim sendo, o nuclear na era pós-Fukushima terá dificuldades em afirmar-se se não combater eficazmente a percepção pública de risco associada a essa temática. Não é deixando de falar do nuclear que se fará desaparecer essa percepção, é fazendo exactamente o oposto, enunciando todos os pressupostos e riscos mas também todos os benefícios e mais-valias. Decida quem tiver que decidir. Os incidentes de Fukushima terão impactos negativos a nível da exploração da energia nuclear numa sociedade com receios ou medos daí que seja fácil prever uma diminuição da aposta neste tipo de energia bem como uma necessidade de aumento de segurança das centrais nucleares futuras. A China que tem 27 centrais nucleares em construção, já parou a construção de cerca de 7. A Venezuela, que estava a construir uma central nuclear, em parceria com a Rússia, parou o projecto. A Alemanha e a Suíça vão rever a sua política de nuclear e muitos outros países se lhe seguiram. Portugal não terá que discutir com Espanha a política nuclear espanhola, dado que as centrais espanholas se localizam ostensivamente na fronteira portuguesa? Há que discutir e negociar. Se Portugal está sujeito a riscos potenciais, associados a hipotéticos problemas com os reactores nucleares, deve exigir dos espanhóis contrapartidas económicas. No futuro, o nuclear será mais seguro porque temos capacidade de aprender com os nossos erros. No futuro, a produção de energia nuclear será mais difícil se a percepção pública de risco for a que actualmente existe. De momento, e no cenário de crise económica em que nos encontramos, temos que retirar dividendos da opção “não nuclear” portuguesa.

(In A União)

4 Comments:

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