domingo, janeiro 30, 2011

Acima das Nuvens

A instalação da estação experimental de monitorização da atmosfera na montanha do Pico arrancou em julho de 2001. Um avião da força aérea americana atravessou o oceano, vindo dos Estados Unidos da América, carregado de equipamento para ser colocado no local. O projeto começou com um desafio colocado pela Universidade Tecnológica de Michigan, na pessoa do professor Richard Honrath, à Universidade dos Açores. Este terminava em 2003, mas o interesse dos dados recolhidos tem levado a que a estação funcione até hoje.
O potencial do topo da montanha do Pico para instalar uma estação global de monitorização dos fenómenos da atmosfera no Atlântico, cada vez mais importantes numa altura em que as alterações climáticas estão no centro das atenções, foi o tema da oração de sapiência proferida pelo professor Paulo Fialho, na cerimónia de comemoração dos 35 anos da Universidade dos Açores. Alguns dias mais tarde, recebe-nos no seu gabinete no edifício interdepartamental, a meio de um corredor pintado de laranja vivo. "Numa altura em que se fala de excelência, este é um campo de excelência da Região no panorama internacional", começa por dizer, sem qualquer sinal de dúvida a esse respeito.
Quanto ao que de facto está em causa, explica: "Estamos a falar em tudo o que tenha a ver com a informação necessária ao incremento do conhecimento científico que pode permitir a melhoria de tudo o que são modelos de previsão, que depois mais tarde podem ser aplicados em termos de socorro às comunidades".
Em causa está medir o pulso à química e a física da atmosfera. "Hoje em dia fala-se muito de mudanças globais em termos atmosféricos, que se verificam, mas essas mudanças só podem ser estudadas se tivermos um conhecimento sobre a química do que se está a passar e de como esses fenómenos interferem em termos de comportamento físico da atmosfera", afirma.
E não se pense que se está a falar da tradicional meteorologia. "A meteorologia, do ponto de vista tradicional, foca-se essencialmente na vertente física. O grande desafio que se coloca é o estudo da componente química, pois é ela a responsável pelas alterações de todos os equilíbrios. Concretamente, refiro-me às reações que ocorrem, como a questão do buraco do ozono. Já há, inclusivamente, um prémio Nobel que identificou essa situação, que propôs o mecanismo que estava ocorrer e as medidas mitigadoras que podiam ser tomadas, porque houve um acréscimo de conhecimento. A comunidade científica sabe que é importante fazer estas medições. Se não tivermos essas medidas nada adianta, porque as teorias ainda estão num estado muito primário. O nosso conhecimento ainda é muito rudimentar e se não existir informação experimental, dificilmente se pode prever o que vai acontecer", alerta.


Região limpa
Os Açores estão situados no centro do oceano Atlântico. Na ilha do Pico, a mais alta montanha de Portugal oferece uma plataforma ideal para olhar a atmosfera. Duas razões fazem com que este seja um cenário irrepetível no globo: A altitude permite medições regulares acima das nuvens e a pureza do meio ambiente evita o ruído e a contaminação provocado pelo volume de poluição verificado noutros locais.
Uma estação de monitorização para o Atlântico poderia ler os fenómenos sobretudo do continente americano, mas também do europeu e africano.
Segundo o professor da Universidade dos Açores e responsável na Região pelo projeto experimental no Pico, no mundo existe apenas uma estação com estas características, uma plataforma situada em altitude acima dos 1500 metros. "É a de Mauna Loa, no Pacífico, detida pelos norte-americanos. Os Açores têm o que chamamos o 'porta-aviões' no meio do atlântico, nove pedacinhos de terra no meio do Atlântico, que tem a sorte de ter a uma montanha com uma plataforma que se encontra acima, com uma certa prevalência, das nuvens, e portanto, da chamada zona de inversão. Não é por qualquer razão que os americanos já há muito tempo viram isto, bem como o príncipe do Mónaco, em finais do século XIX, que tinha ideia de que era importante colocar ali uma estação meteorológica. Hoje temos a tecnologia para poder chegar lá", reflete Paulo Fialho.
Nesta altura, o que existe na montanha do Pico é um módulo experimental hermético termostatizado. Depois, há equipamentos lá colocados que têm sondas para o exterior que puxam ar e fazem as medições. Governo Regional, Instituto de Meteorologia e Força Aérea Portuguesa têm sido parceiros do projeto em torno da estação que é agora propriedade da Universidade dos Açores. Mantém-se a colaboração com investigadores norte-americanos, que não assume, por agora, contornos oficiais.
De acordo com Paulo Fialho, o equipamento experimental faz medições de superfície, ou seja, do ar que se encontra naquela altitude. "Há estações que fazem medição da radiação do sol que chega ao solo, mas aí já estamos a falar de medidas de coluna vertical. Se tivéssemos outros equipamentos podíamos fazer o perfil vertical, saber como determinadas espécies de concentrações variam ao longo da altitude. Isso é feito, nalguma medida, em termos das rádio sondas de temperatura, pressão, direção e velocidade do vento, pela Força Aérea Portuguesa, na Base das Lajes. Poder-se-á, também usando ozono sondas, fazer o perfil vertical do ozono, mas já estamos a falar de uma situação muito mais cara", adianta.
Quanto aos dados que têm sido recolhidos até agora, Paulo Fialho releva a sua importância. "Estes dados, que já deram origem a várias publicações, permitem estabelecer relações entre a variabilidade do ozono e do monóxido de carbono, por exemplo. O monóxido de carbono é um traçador dos processos de combustão e, portanto, dá-nos essa relação de química de proporcionalidade entre as fontes emissoras e o que acontece em relação às longas distâncias. São questão mais técnicas, que permitem depois introduzir nos modelos, em termos da matemática, como é que estes compostos se interrelacionam".
Além disso, são estudadas as relações com os óxidos de azoto. As medições dos níveis de aerosol carbonoso já estão quase a completar uma década de duração. "São parâmetros que caracterizam estes elementos e a sua variabilidade. Por exemplo, quando há emissões dos fogos na zona do Atlântico Norte, do Alasca, no verão, vemos aqui o aumento da intensidade desses sinais, que são reflexo da propagação das emissões nessa área", exemplifica. "Qualquer emissão que seja feita, essencialmente a nível do continente americano, ou do africano ou mesmo da Europa, dependendo da situação atmosférica, conseguimos ver o incremento face ao que é a situação de fundo, a situação 'normal', estável", acrescenta.
Mas a ausência de grandes indústrias e consequente a pureza do ambiente açoriano não permite apenas medições em zonas de altitude, defende o especialista. "A nível da superfície há muitas coisas que se podem fazer. A camada marítima, aquela que está a mais baixa altitude, permite fazer a caracterização do fundo marítimo, que é importantíssimo para os modelos porque nos permite ter um ponto de referência. Se esse ponto de referência não existir, não sabemos quais são os impactos das alterações. Para saber um impacto, tenho de saber como é que era", esclarece.
"Isto que está feito é meramente um projeto experimental, para mostrar que é possível e que existe um valor na informação que se pode lá recolher. Agora, o grande desafio, que se pode materializar numa estação da rede internacional, é conseguirmos passar à fase seguinte. É claro que não estamos se calhar na melhor das alturas, porque atravessamos uma crise, mas é uma questão de estratégia", conclui.

O que podia existir
Não é preciso pensarmos numa estação gigantesca, repleta de investigadores. Não é isso que é necessário, garante Paulo Fialho, para aproveitar o potencial do Pico no estudo dos fenómenos atmosféricos. "Naquela altitude estamos a falar de algo que não necessita de ser grande, não tem, nem interessa que tenha, pessoas. Tem de ter, isso sim, os recursos de energia suficientes para termos um conjunto de instalações colocadas e condições de acesso fácil para dar um apoio mínimo quando é necessário. Se for preciso fazer uma missão de mais de um dia, também é preciso ter o espaço para dar apoio a um ou dois investigadores...".
Para o projeto avançar é preciso o apoio de vários parceiros. "Alertei para quatro entidades nesta altura que poderiam dar o arranque: Governo Regional, Instituto de Meteorologia, Universidade dos Açores e Força Aérea Portuguesa, atendendo às especificidades do terreno. Quanto aos Estados Unidos, têm sido um parceiro natural, que tem puxado por Portugal para este tomar a liderança. Se repararmos, os americanos, de um modo, geral, há muito tempo que perceberam o potencial desta zona. Temos de estar atentos, mostrar que somos capazes e encontrarmos parceiros nas universidades portuguesas, etc. Penso que devemos ser nós a tomar a dianteira".
Atualmente, os dados que podem ser recolhidos no Pico continuam a despertar a atenção da comunidade internacional. "Temos várias solicitações. Este projeto foi experimental, para durar entre 2001 e 2003. Quando chegou ao final de 2003, a qualidade da informação foi de tal ordem, que, com parcerias portuguesas e americanas, foram feitos investimentos para manter o sistema a funcionar. Temos, inclusivamente, do lado americano, o pedido de começarmos, entre 2011 a 2015, a fazer um projeto financiado por eles, só para caracterizarmos a componente de aerossóis, que é uma área muito interessante", diz. Deve arrancar este ano também uma colaboração com os ingleses, no âmbito do projeto BORTAS (Quantifying the impact of Boreal forest fires on Tropospheric oxidants over the Atlantic using Aircraft and Satellites).
Por agora, Paulo Fialho lembra a principal vitória. "Em termos de logística uma operação destas é extremamente complicada. Havia grandes resistências na comunidade científica internacional, em relação à capacidade de coordenação portuguesa. Foi aí que marcámos a diferença. Porque conseguimos, demonstrámos que era possível". Agora falta o próximo passo.

(IN DI-Revista)


3 Comments:

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